Tempo de friagem
Curitiba nunca é tão Curitiba
quanto no finzinho do outono, comecinho do inverno. É nesse período que toda a
curitibice aflora em sua maior intensidade.
Comecemos pelo clima que no
fim das contas é o grande causador desse desabrochar da consciência curitibana.
O veranico de maio, que nesse ano foi no meio de junho, é como se o verão
tivesse esquecido o celular na cidade e voltado aqui pra buscar. Dias lindos,
24 graus, gente na rua, no parque, cobertores arejando nas janelas como que se
preparando pra longa jornada que enfrentarão pela frente. Uma ou duas semanas
de idílio, como se fosse um bônus por tudo que iremos passar a seguir.
E de repente, não mais que de
repente, quando tá todo mundo de regatta correndo no parque, o frio chega
rachando, zerando os termômetros, as
telas dos celulares e as páginas do facebook.
Aí sim é Curitiba. O céu mais
azul do mundo, a geada, a bruma sobre os lagos do Barigüi, Passeio Público e do
São Lourenço. O sol saindo de fininho lá pelas 8 da manhã, deixando tudo
dourado. Ao meio dia a amplidão térmica faz todo mundo tirar pelo menos dois
casacos e maldizer a moça do tempo da TV.
Muda tudo na cidade, os
passeios, as comidas, os humores. Saem as bernudas e entram luvas, ceroulas e
cachecóis. Sim, porque curitibano usa ceroula, usa mesmo. As pessoas contam as
camadas de roupa. Sai o chopp e entra o quentão. Sai a salada e entra o sagu
com gemada. Surgem os buffets de sopas. O pinhão reina absoluto, sapecado,
cozido, em sopas e risotos da nova onda de restaurantes. A gente só pensa em
comida e cobertor.
As mãos esfriam, as pessoas
dormem de meia. As crianças dormem com os uniformes da escola por baixo do pijama,
ou vão pra escola com o pijama por baixo do uniforme. A pele resseca, o laser
bomba. Todo mundo solta fumaça quando respira.
Até a postura das pessoas
muda. De repente todos os ombros se tensionam, os braços se cruzam em frente ao
peito, as cabeças se abaixam para evitar o vento. O passo apressa. A conversa
mingua. A expressão se retrai, nos chamam de pessoas fechadas.
O ar fica limpo, mudam as
flores, mudam os tons. A cidade se acalma, silencia, as mesas nas calçadas que
brotaram em janeiro murcham, as ruas ficam tremendamente vazias à noite. As
lareiras se acendem,a casa se aquece. Todo curitibano reclama, e secretamente
adora tudo isso. Toda alma curitibana de alimenta desse sol cálido, dessas mesas
fartas, desse clima gelado, desse astral. Curitibano é flor que brota no frio!
17/06/2015