Em seu polêmico depoimento Caetano Veloso decretou:
não volto mais à Tel Aviv! Ele pode falar, tem todo o direito. Aliás,
ele sabe muito bem o quanto custou ter essa liberdade de poder falar o que bem
entender, Esteve lá na época em que isso era proibido, pagou seu preço, foi
exilado, blá blá blá.
Vou falar também.
Porque também posso. Falo como judia da diáspora, um lugar seguro de onde, assim
como Caetano, me sinto livre para dar pitacos na vida dos outros. Não vivo a
dor e a delicia de estar lá, apenas sofro por um ver um lugar que para mim é tão
importante estar constantemente envolvido numa situação tão dolorosa.
Uma casa onde os filhos brigam demais.
Ao contrário do que
se supõe, e aí esta a beleza da coisa, muitos, mas muitos judeus israelenses ou
da diáspora como eu não concordam com a política belicista do Netanyahu.
Muitos de nós não gostam do fato de Israel precisar mobilizar toda a sua
juventude em um exército. Não gostamos do fato desse exército ser tão atuante. Não gostamos de precisar inventar o Domo de Ferro. É triste. Não gostamos de ataques
aéreos. Não gostamos de usar a força, não gostamos do fato de precisarmos da
força. Mas também não gostamos de facas, de tuneis, de gente dizendo de que não
podemos existir. Não gostamos de bombas em ônibus, aliás não gostamos de
bombas em geral. Nem de tanques, morteiros, misseis. Também não gostamos de
assentamentos, nem de muros. Não gostamos de terroristas, não gostamos da
extrema direita. Não gostamos de sirenes. Não gostamos de escudos humanos. Não
gostamos de campos de refugiados. Não gostamos de revistas. Não gostamos de
patrulhas. Não gostamos de ameaças. Não gostamos do medo. Não gostamos de
boicotes, de parcialidade, de radicalismo. Não gostamos de sangue. Não gostamos
de nada disso. Discordamos sempre que algo nos incomoda, nos revolta, nos
agride. Podemos nos manifestar. Posso dizer tudo isso porque, como judia, não
me sinto pressionada, não tem patrulha que me obrigue a ser sempre pró Israel,
embora eu seja. Defendo Israel, mas vejo seus defeitos. Não sou ingênua nem
maniqueista, posso simplesmente não concordar. Eu posso daqui, os Israelenses en loco. Os israelenses podem
criticar abertamente seu primeiro ministro e o fazem constantemente. Os
israelenses protestam nas ruas, nos jornais, nos filmes, nas músicas. Eles
podem. Caetano deve ter visto, lido e assistido muitos desses protestos. Mas,
sobretudo, os israelenses protestam nas urnas e também quando assinam suas deserções.
Quando falamos que
Israel é a única democracia da região não estamos falando
de uma figura de linguagem. Não é apenas um dado para ser colocado nos livros
de geopolítica. Essa democracia é uma forma de vida, que influencia diretamente
o rumo desse caldeirão de pólvora chamado oriente médio.
Essa democracia é real. É o garante liberdade de expressão, uma economia estável, desenvolvimento social, ensino de qualidade e todos os marcadores de um país desenvolvido. É mais do que isso, é também o que garante mulheres livres, que permite que os partidos árabes ganhem cadeiras no
parlamento israelense, que a direita vença eleições,
que existam coalizões nesse parlamento e que militantes do Breaking the Silence levem
cantores latino americanos para Gaza conhecer o "outro lado" da
história. Essa democracia também permite o diálogo. Permite que o Shalom Achshav (Paz Agora) continue sua luta de tantos anos.
Estamos longe da
verdade quando ouvimos daqui ecos mal contados sobre o que se passa lá. Estamos
apenas tocando a superfície de um problema de uma complexidade enorme onde cada
lado tem infinitos momentos de razão e outros incontáveis momentos de trágicos
erros. Lá e cá. Porém, existe e sempre existirá quem acredita na
possibilidade de paz. Milhares de pessoas dos dois lados que tentam com
projetos e ações conjuntas, diminuir o caminho entre nós. Pessoas que tentam
tirar o ódio, a dor e o sangue da equação.
Caetano não vai
voltar pra Tel Aviv. O que ele não
vai mais poder ouvir, são essas vozes dissonantes, que
acreditam poder mudar essa realidade, que nossas igualdades sejam maiores do
que o que nos separa. O que Caetano não poderá ver são essas pessoas
maravilhosa que lutam pela paz. Azar o
dele.
Oi Ilana, gostei muito do que voce escreveu.
ResponderExcluirConcordo plenamente com suas colocacoes.
Quem como eu que tenho 3 filhos (dois ja serviram exercito e o terceiro durante) gostaria de ver a paz e a harmonia para todos, arabes e judeus, esquerda e direita, religiosos e laicos.
Aqui conheci e convivi com arabes da faixa de gaza que trabalhavam conosco dia a dia, com igualdade de direitos e respeito mutuo.
Quem sabe hoje o que se passa com eles ? Sera que eles tem trabalho ? Como sustentam suas familias ?
Enfim, realmente foi lamentavel e muito unilateral esta reportagem do Caetano, quem sabe ele esqueceu ou abriram mao de mostrar a ele o que e feito em Israel , o desenvolvimento , a tecnologia, as pesquisas que trouxeram e ainda trazem ao mundo remedios e cura para muita gente.
Enfim, como voce disse, AZAR DELE.
Nos continuaremos apesar dele.
Lembrancas
Arthur Melon
Melon querido!
ExcluirInfelizmente a gente ainda vai ver muito preconceito e muita dor. mas acredito que tem gente fazendo a diferença, e só por isso, ja vale a pena. Beijos, Ilana
Parabéns pelo belo texto que, apesar de você não querer demonstrar, é de uma sonhadora. Não nega o DNA!
ResponderExcluirDélia Guelman
Precisamos sonhar sempre, não é Delia? Um abraço, Ilana
ExcluirBoa Ilana, muito legal.
ResponderExcluirAzar dele mesmo.
Boni
Simples assim! Perfeito.
ResponderExcluirBetina Kleiner
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirIlana, parabéns! Alguém ter a coragem de despir mitos neste país (e em todos os outros) é alguém que merece meus (e nossos, de todos) respeitos. Uma vez, um amigo meu, que passou 26 anos como correspondente de O Estado de S. Paulo no Oriente Médio, ao ouvir-me perguntar sobre a região e seus conflitos, respondeu-me, na lata: estudei muito, vi, ouvi, conversei muito e voltei de lá sem entender quase nada do que ocorre por lá. Não é só por olhar - de longe - uma realidade que temos o direito de, como sempre acontece com Caetano, provocar borbulhas. O buraco é mais embaixo. Ele não deixa de ser interessante e um dia tentei caracterizá-lo: onde todos vestem terno, ele vai de saia para causar espetáculo; onde todos vestem saia, ele vai de terno. Isto é legal. Mas, igualmente é perigoso tanto quanto espetaculoso.
ResponderExcluirNilson, provocar borbulhas as vezes é positivo, nos tira do eixo, nos faz penar. Mas temos que ter muita responsabilidade né? E como dizem por aí, a verdade tem sempre três faces, a minha, a do outro e a verdade. O buraco é sempre mais em baixo e a gente tá longe de chegar perto dele sentados confortavelmente em nossas redomas. Um assunto tão sofrido, merece com certeza mais atenção. beijo grande!
ExcluirParabéns. Vc conseguiu sintetizar o pensamento de muita gente, sejam judeus ou árabes. Mas, como disse Nilson Monteiro, Caetano gosta de provocar borbulhas, pois lhe rende grana e mais ainda quando o partido do governo atual ve nisso um engajamento anti-Israel...azar é só dele...
ResponderExcluirBárbaro, real e sensato !!! Vc é ótima.
ResponderExcluirSolução para Israel, Brasil e todo o oriente médio.......
Israel compra o Brasil.
Perfeito, e esclarecedor!
ResponderExcluirPois e, ele veio visitar a minha casa, sentou no salao, tomou cerveja, ouviu musica, ai um dos meninos (aquele capeta mal educado) contou pra ele que ha um porao na casa. E ele foi ver o porao. E quando voltou pro salao, ja nao dave pra se sentir bem. Tomara que qualquer judeu que venha visitar Israel, no so va ao Kotel com os primos ou ao porto de Tel Aviv, mas visite algum campo de refugiados, alguma barreira no muro ondem ha filas interminaveis, e tambem algum kibutz perto de Gaza. As persepcoes se tornariam mais complexas e menos simplistas. Ja nao daria pra ficar a vontade no salao.....
ResponderExcluirCom certeza visitar os porões, quaisquer que sejam, sempre revelará muitas coisas. Elas podem ser boas, más, assustadoras, maravilhosas, perturbadoras. Porém, a simples disponibilidade de mostrar o porão, já diz muito sobre o dono da casa, não é mesmo? Quem sai vivo dos porões do Hammas? Abraços Ilana
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