Costumo dizer que não tem ninguém mais
curitibana do que eu. E é sério!
Tive uma infância
e adolescência tipicamente curitibana. Ia desenhar no calçadão
da XV, fiz cursos de artes no Centro de Criatividade, comi muito mini pastel no
Pasquale. Era formada em Pedalinho, assídua no teatro do Piá, tinha passe livre
no Parque Alvorada. Comi pinhão no corpinho de jornal enrolado nas cadeiras do
Couto Pereira. Fiz muito churrasco nos quiosques de todos os parques (você fez
no Barreirinha?), batia ponto na Feirinha, conhecia pelo nome os motoristas da
linha norte e Sul do expresso. Dancei no Guaíra (grande auditório).
Sei as primeiras estrofes da música do Paulo Vítola sobre a cidade (do disco
Curitiba Cidade da Gente, o do Bebedouro). Saí no Dino. Até aí tudo bem, você
deve estar pensando. Porém brinco que tenho três estrelas no meu
currículo curitibocas que são difíceis de igualar: primeira, fui
maquiada por um irmão Queirolo para ser a Boneca de Piche na gincana
de escolas do Programa Mario Vendramel e tenho isso em vídeo.
Complicou a competição, não é? Segunda: escrevi um dicionário de 300
verbetes em curitibanês no aniversário de 300 anos da cidade que saiu na
extinta Vejinha. E agora, pra tirar a chance de qualquer um nessa disputa,
minha cartada final. Sou tão curitibana que até já tomei banho no Rio Belém,
isso na década de 70, antes da despoluição do mesmo. Fui ungida
em curitibananice nas águas turvas do nosso rio maior. Pronto ganhei!
Mas o que me torna a
curitibana das curitibanas é que tive, e tenho, Curitiba como minha irmã, a
caçula, a quem jurei fidelidade.
Cresci com a cidade no
meio da mesa do almoço e do jantar. Cresci escutando em primeira mão as
mudanças que iriam transformar a vida e a cara dessa cidade pacata, onde eu
brincava na rua. Cresci discutindo (sim, discutindo, porque mesmo pequena,
tinha voz ativa na conversa) os projetos às vezes mirabolantes que estavam por
vir.
Vi meu pai e minha mãe
cuidarem dessa cidade como se fosse uma filha. Meu pai pensando em seu futuro, minha
mãe no seu bem estar. Como uma família. Assumi o meu papel.
Por isso sinto um ciúme
descomunal de cada rua e casa dessa cidade. Por isso, cada vez que falam que o
Curitibano é isso ou aquilo, acho que é ofensa pessoal. Por isso sofro quando
as casas da minha memória são levadas pela especulação imobiliária. Por isso me
irrito ao máximo com o padrão dos novos postes de luz que parecem pinicos ao contrário invadindo nossas ruas.
Por isso choro com cada arvore que cai. Por isso ligo pro 156 pra contar as
pequenas feridas que vou vendo aparecer na minha cidade. Por isso me
destempero quando mudam ruas sem um estudo mais aprofundado. Por isso
tenho vontade de montar acampamento em frente ao Ippuc pra pegar todo mundo na entrada e
dizer: cuidem, prestem atenção no que vocês estão fazendo! Por isso me angustio
com essa saopaulização de costumes. Por isso procuro ir
sempre mais longe nos meus caminhos para não perder o contato com as tantas
outras Curitiba que distantes, parecem outras cidades. Me sinto a ombudsman de Curitiba.
Mas por isso também curto
as coisas da cidade com mais intensidade. Vibro com cada festa popular, cada
iniciativa bacana. Curto os night bickers que
há uma década iluminaram as nossas noites e abriram caminho pra que as magrelas
voltassem a ser consideradas um meio viável de transporte. Como em todas as
feiras gastronômicas que abusam da nossa sorte climática e
apostam nesse lado gregário dos curitibanos. Ando e ando e ando pela cidade,
vendo cada gato na janela. Vou passear na XV só pra matar a saudade. Vou ao MON
religiosamente. Vibro com todo artista que consegue sobreviver a nossa antropofagia e brilhar em outras bandas. Uso os
parques, vários deles. Provo os restaurantes que abrem mas não esqueço dos
clássicos. Vou à feira. Fico nos feriados. Crio raízes.
Por isso, não me perco
nunca em Curitiba, afinal, onde estiver, estou em casa!
Lindo conteúdo,adorei. Confesso profunda admiração por seu pai,Jaime Lerner e sua mãe, inesquecível Fanny. Privilégio seu, tê-los tido como seus pais. Uma grande bênção, certamente decorrente de seu merecimento.Parabéns!
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