quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Herói

Durante toda a minha adolescência fiz parte de um movimento juvenil judaico. Esse movimento tinha, e ainda tem, ideias socialistas e sionistas. Esse movimento moldou muito do meu caráter e continua presente em minha vida, pois muitos dos meus melhores amigos são de lá e meus filhos, agora adolescentes, também o frequentam. É uma tradição.
Lá, na década de 80, aprendi muito sobre a sociedade e a política israelense que se formava no jovem país e sobre o conflito árabe-israelí. Nessas discussões todas só havia uma unanimidade, coisa rara, Shimon Peres. Era o nosso herói.
Um homem que viveu os momentos mais importantes da história do Estado de Israel. Mais que isso, fez e escreveu a próprio punho grande parte dessa historia.  Um dos seus fundadores de Israel, protagonista em toda sua história, membro de uma geração forte e determinada, que entendia seu papel na História, não só do novo país, mais de sua época. Sempre uma voz calma e lúcida, sempre a razão, sempre o respeito, sempre e sempre e sempre a busca da paz. 
Quando passei um ano estudando em Israel, uma das atividades que fizemos foi participar do Congresso Sionista, o mesmo criado por Theodor Hertzl, alguns anos antes de mim. Um momento especial, emblemático. Porém, a única coisa que me lembro do Congresso foi a enorme emoção de simplesmente estar no mesmo lugar que Shimon Peres. Tenho a foto, eu no terceiro balcão do teatro Binianei Hauma e ele na mesa no palco. Um pontinho na minha foto, uma enormidade na minha formação. Um exemplo de homem, líder, político, humanista. Uma pessoa que você quer sempre ouvir.
Mais que o Nobel da Paz, acho que o grande legado de Peres foi ter inspirado milhões de jovens como eu durante toda a sua vida. Com ele aprendi o sentido da Coexistência, com ele aprendi sobre homens de fibra, com eles aprendi que era importante ceder, com ele aprendi o real significado de estar sempre, sempre, a favor da paz. 

Israel perde um pouco de sua essência hoje, todos os judeus do mundo perdem uma referência. Que sua luta de vida vença no final. Que todos tenhamos paz.

P.S.: Se você nunca o ouviu, procure no Youtube e veja qualquer entrevista, todas são liçoes de vida.  

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Nunca

Nunca fiz nada que não esperavam de mim, é a minha natureza. 
Nunca pintei o cabelo, nunca fiz tatuagem.
Nunca fugi de casa, nunca roubei o carro dos meus pais.
Não sou de arroubos, não sou de loucuras, não sou corajosa. Uso o freio.
Não sou atirada, não uso calça rasgada, não mostro alça do soutien. 
Não sou o centro das atenções, não chamo atenção, sumo.
Não peço favores, não peço dinheiro, não devo.
Não me abro frequentemente, não divido com facilidade, não mostro tudo, preservo.
Não escancaro, não gosto de chamar atenção, não provoco. 
Não largo tudo, não sumo. Sou firme, sustento.

Gosto do certo, do arrumado, do tempo no relógio, da pontualidade. 
Gosto de arrumar, gosto de simetria, gosto da harmonia. Ângulos retos.
Gosto de tarefas, de prazos, de desafios, de cumpri-los. 
Gosto do controle, gosto de listas, organizo.
Gosto da leitura, do cinema, e talvez só nesse quesito cultural permito a transgressão maior: dançar. Sempre que posso, sem onde nem por que.

Sou do olhar, aquela que observa, registra, por isso escrevo. 
Sonho, fantasio, faço roteiros inteiros, internos, platônicos. 
Vivo mais na minha cabeça que no mundo em minha volta. 
Uso o texto para viver o que não teria coragem de fazer. 
No papel, abro o que geralmente escondo. 

No papel, revelo. No papel, existo.

sábado, 17 de setembro de 2016

A minha cidade é minha

   
 A minha cidade é minha.  É minha porque cuido, porque zelo por ela. É como alguém da família. Sei dos seus defeitos e procuro ajudá-la a repará-los. Sei de suas qualidades e procuro enaltecê-los. Essa cidade é minha porque conheço seus caminhos, seus ritmos. Sei da sua pista mais rápida, o caminho mais curto, a casa mais bonita, o ipê mais florido.  Essa cidade é minha porque a amo e quero sempre o melhor pra ela.
   É bom quando as pessoas fazem da sua cidade uma extensão do seu lar, assim deveria ser sempre. O mesmo cuidado que se tem com a sua casa, se ter coma sua cidade, Todo mundo deveria pensar assim, a cidade agradeceria. 
   Porém o que vemos hoje é simplesmente o contrário. Ninguém se importa. Ou então as pessoas andam muito desleixadas com as suas casas. 
   Tá todo mundo fazendo o que bem entende, ou melhor, o que não entende. É gente que corta árvores sem autorização, é gente que não separa o lixo, é gente que para seu carro onde não pode. Gente que amplia sem alvará, gente que invade sem permissão. Gente que se apropria do coletivo, gente que usa o que não é seu. Gente que suja e não limpa, gente que invade a canaleta. Gente que quebra vidros e marca seus nomes em qualquer canto. Gente que dá um jeitinho, que constrói mais alto do que deveria. Gente que picha os lugares mais improváveis deixando essas cicatrizes horrendas na cara da nossa cidade. Gente que não liga, que desrespeita, que agride. 
   Dividimos a cidade com quem amamos e com quem não conhecemos, e esse talvez seja o maior desafio da cidade. Temos que cuidar do que é nosso e temos que respeitar o do outro, como em casa. Tenho que ceder a vez no trânsito, mesmo estando com pressa. Tenho que dar bom dia mesmo estando de mau humor. Tenho que limpar a mesa, mesmo estando com preguiça, tenho que gostar, mesmo quando estou com raiva. 
    A minha cidade é minha, mas não é só minha, É do vizinho, do estranho e principalmente é a cidade dos meus filhos. Tenho que fazer com que entendam da responsabilidade que é ser um cidadão. Assim como devem arrumar o quarto, como devem escovar os dentes, como devem fazer a lição, eles devem aprender que os deveres e valores que aprendem em casa devem ser expandidos, devem alcançar muros e praças, ruas e avenidas. A minha cidade é minha, a responsabilidade por ela também.