sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Quem não tem papel dá o recado pelo muro

A campanha eleitoral fez a sua primeira vítima nas terras das araucárias e não é nada disso que você está pensando. Não se trata de morte, mas é tão triste quanto.
Perdemos a única intervenção pública feita pelos grafiteiros Gustavo e Otávio Pandolfo, internacionalmente reconhecidos pelo simpático nome de OSGEMEOS.
O lindo desenho feito pelos OSGEMEOS, ficava no muro de um estacionamento na Praça 19 de Dezembro, a do Homem Nu, e era de uma delicadeza infinita. Pequenininho, diferente das tantas produções gigantescas que os artistas já fizeram pelo mundo afora, era quase um segredo no meio de várias pichações e outras figuras. Quando o vi pela primeira vez, achei que estava me confundindo, uma obra de tanto valor assim, solta, sem nenhuma referência, podia estar enganada quando à autoria. Por outro lado, o traço tão característico da dupla não deixava margem para muitas dúvidas. Era um legitimo OSGEMEOS: as proporções das figuras, as cores, tudo lá. Às vezes mudava o meu caminho só para dar uma passada por lá, dar um alô pra essa figura que alegrava o meu caminho. 
Não mais. 
A fachada do muro foi toda pintada de azul e a minha querida figurinha deve estar agora sob as letras da infame propaganda eleitoral. 
Isso me fez pensar na importância que damos (damos?) para a famosa street art. Não é pichação, nem mesmo grafite, é o upgrade de tudo isso. No mundo todo, artistas estão cada vez mais sendo reconhecidos pelos seus trabalhos feitos nas ruas. Jean Michel Basquiat foi um dos primeiros, lá pelos anos 80. O artista deixava seu trabalho quase anonimamente pelas ruas de Nova Iorque. Hoje, a coisa está no mundo todo. Taí o Beco do Batman, em São Paulo, que já virou item imperdível dos roteiros turísticos mais descolados. 
Alguns artistas preferem pequenos espaços, pilares de viadutos, muros, às vezes até um poste bastam. Outros assumem grandes fachadas como o simpático Ray Charles que nos convida para um gigante sorriso na rua XV de Novembro. Outro exemplo. A Praça Espanha vai virar um grande museu a céu aberto, graças aos artistas que vão emprestar seu talento aos feiosos tapumes que cobrirão o espaço durante a sua reforma. Como ficar indiferente?
Adoro gente que se apropria da arte dessa forma, adoro ver a cidade tomada pela arte dessa forma. São coisas que transformam a nossa percepção, provocam reações, quebram a monotonia do cinza e geralmente alegram a nossa alma. Às vezes são ácidos, às vezes são poéticos. Belos pra mim, não necessariamente serão para você. Mas estão lá, quase gritando pela nossa atenção entre o vermelho e o verde do sinaleiro, ou surgindo quando você menos espera, ao dobrar a esquina.
Esses dias achei um mosaico num poste da ciclovia que liga o Bosque do Papa ao Parque São Lourenço, achei super simpático. Na mesma trilha tem uma manilha de concreto que virou uma cabeça de Playmobil, sensacional. São pequenas surpresas escondidas na paisagem urbana. Me sinto às vezes como criança num gigantesco caça ao tesouro, indo de uma pista a outra, desvendando os desenhos espalhados por ai. Tem diversão melhor?
A gente tem que personalizar as cidades cada vez mais, se apoderar delas, torná-las nossa. A street art é isso, é a nossa decoração na nossa cidade. Cuide, preserve, patrocine. Se você tiver a sorte de ter um bom exemplar dela na sua casa, muro, parede, resista aos nobres vinténs dos candidatos da estação. Lembre-se, eles podem ser efêmeros, a sua arte não.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Linhas cruzadas

Cada dia que passa mais e mais fios pairam sobre nossas cabeças. O que é uma contradição em tempos de Wi-Fi, blutooth e tecnologias similares.
Em casa,  aquele emaranhado de fios horrorosos atrás do computador me dá sempre a impressão de que o dia que precisar mexer em algo, nunca mais saberei o arranjo certo, onde vai cada plug, o quê  liga o quê.
Nas cidades é ainda pior. Estamos saturados de fios por toda a parte. Não existe um lugar que se olhe que não seja cortado por aquele traço preto que estraga toda e qualquer perspectiva. É fio de luz, fio da net, fio do telefone, é fibra ótica, é o caos. Odeio isso.
E cada vez me convenço mais que metade do que se vê é desnecessário. Tenho certeza que ninguém vai lá e fala: “esse fio não é mais usado há décadas, vamos tirá-lo”. Aposto que só existe a regra do adicionar, nunca tirar. Duvido que tenha um ser humano no planeta que saiba da função de todos os fios conectado a um só poste. Aliás, tem postes em Curitiba que deveriam entrar no Livro dos recordes de tanto fio pendurado. Vi de tudo pairando por ai, nós, ondas, cachos, emaranhados medonhos. Tem até umas fivelas que tentam domar, organizar e separar os fios.
Essa cabeleira desgrenhada enfeia a cidade. Além disso  é perigosa e é frágil demais. Basta um carro, um vento, uma chuva e lá se vai a nossa preciosa energia por horas.
Isso sem falar nas árvores que são sumariamente amputadas, desfiguradas, quando não assassinadas, para salvar as preciosas linhas de transmissão. Já tive que me despedir de três árvores maravilhosas, sendo uma delas um lindo pinheiro, por causa dessa “nobre” causa. Um crime!
Nessas horas sinto uma inveja danada dos moradores de Carmel na Califórnia, que votaram - sim votaram! - por não ter postes de luz nas calcadas para não estragar a beleza do lugar. Isso numa época em que a tecnologia não permitia ainda que se fizesse uma rede subterrânea e a cidade optou por não ter iluminação publica. Não é conversa, eu vi! Andei pelas ruelas escuras da cidade à noite mas me encantei  com o maravilhoso e despoluído cenário de dia!

Se você mora numa cidade pequena, exija já que essa fiação toda seja enterrada, ainda dá tempo! Aqui nas terras dos pinheirais decapitados, dizem que seria uma fortuna fazer isso agora. Então não percam tempo, façam o plebiscito já!  

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Fechado pra balanço.

A gente não escapa, chega dezembro e a cabeça começa a divagar. Você esta no carro, o sinal fecha e quando você vê, tá fazendo aquele célebre balanço de fim do ano. Não dá pra controlar.

Esse não foi um ano fácil., mas foi certamente inesquecível. Muitas coisas aconteceram nesse nosso pais, para o bem e para o mal. Tivemos uma bela e controversa Copa do Mundo. Ao contrário do caos esperado, foi um evento lindo e alegre, até acontecer a tragédia dos 7 x 1 . Inesquecível. Tiveram as emocionantes manifestações, um milhão de pessoas nas ruas pedindo por mudanças.  e tivemos eleições que pouco ou quase nada mudaram.  Inesquecível. Tivemos os primeiros políticos graúdos presos por corrupção e tivemos a prova que ela continua por aí,  firme e forte nos corredores dos Palácios e da Petrobras. Inesquecível. Isso pra ficar só nas principais manchetes.

Pessoalmente foi um ano de grandes alegrias e enormes tristezas. Passei o aniversário em Barcelona com minha família, Inesquecível! Fiz uma festa linda para celebrar o bat mitzvah da minha filha. Inesquecível! Gritei demais da conta. Inesquecível! Viajei com meu pai para os Estados Unidos para o lançamento do livro dele que ajudei a viabilizar por lá. Inesquecível! Meus filhos tiveram problemas na escola. Inesquecível. Estive com os amigos em diversas mesas, recheadas de boa comida, boas vinhos e boas risadas. Inesquecível! Ganhei uns quilinhos. Inesquecível! Fiz uma viagem incrível com uma nova turma de amigas queridas e divertidas. Inesquecível! Não finalizei todas as tarefas que me propus. Inesquecível Ajudei a organizar um encontro emocionante com 200 amigo de uma vida inteira. Inesquecível! Bati o carro de novo. Inesquecível! Fui pra Boituva, Inesquecível!  Perdi o Lúcio. Dor imensa, inesquecível!

Então não dá pra dizer se o ano foi bom, ou ruim, se as coisas boas suplementaram as más, se fui mais feliz ou mais triste em 2014. Só posso dizer que foi um ano intenso, verdadeiro, que me deu sentimentos absurdamente maravilhosos e terrivelmente dolorosos. Vida real, com açúcar e pimenta. Com sol e chuva. Mordida e assoprada. Não fecho o balanço, sigo vivendo pronta e  inteira pro ano que vem. Que ele seja  feliz. Que seja um ano de paz. Para todos.  Feliz 2015!

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Me dá 5 minutos?

Você já ouviu mil vezes: acabou o ano. Você já ouviu outras mil vezes: o tempo ta passando cada vez mais rápido. Nem vou discutir a questão fisico-temporal. O tempo está passando mais rápido, ponto!

Claro que a nossa vida esta cada vez mais corrida e isso nos dá essa impressão de pressa desenfreada, meses que passam num piscar de olhos, dias que nem percebemos, a sensação que o fim de ano chega quase depois de julho. Minha semana só tem sextas-feiras. Quando me dou conta, já é sexta, nem vi o que aconteceu, zum,  passou voando. E contando o tempo em sextas, o ano fica muito curto, 52 delas, as vezes menos. Cadê? Acabou!

Quer uma prova? Esses dias estava vendo a novela Dancin Days no canal Viva. Além das roupas e cenários oitentinhas o que mais me impressionou foi o ritmo da novela. Tomadas muito looooongas, Cenas que se arrastavam por horas falando de um assunto que nem era importante pra trama central. Pessoas lendo revistas, várias páginas, sem uma palavra sendo dita. Tempo se esparramando! Hoje, numa novela, cada take tem no máximo 20 segundos, com muito esforço. Mil imagens, cortes, tudo acelerado. Como nós, o ritmo das nossas vidas virou um clip maluco editado em mil pedacinhos de  5 segundos.

Mas o que me faz ter tanta certeza e a prova irrefutável  de uma questão cientifica tão complexa - a aceleração real do tempo, é que nossos filhos sentem o mesmo. Você lembra de quando você era criança? Nem existia essa percepção do tempo. A gente tinha tempo simples assim. A gente fazia o tempo da gente. Ninguém estava nem preocupado com isso, a gente estava curtindo todo o tempo do mundo. Tempo era coisa pra quem não o tinha, isto é, coisa dos adultos.

As crianças de hoje não. Estão sempre sem tempo. O tempo tá correndo pra elas também o que é um desastre quântico sem proporções. Elas correm como adultos, vivem como adultos, É tempo pra brincar, tempo pra comer, tempo pra estudar, tempo pra dormir, tudo cronometrado. Quando vejo as crianças de hoje bombardeadas por esse mundo mega editado, fazendo mil coisas ao mesmo tempo, vejo o reloginho biológico deles ir acelerando perceptivelmente. A infância ficando cada vez menor, a correria chegando cada vez mais cedo, A percepção do tempo! Me parte o coração.

Tive muito tempo, aproveitei muito a vida sem horário. Não uso relógio, mas mesmo assim sinto a pressão do tempo onde vou. Mas eu tento. Acredito que temos muito tempo ainda, só precisamos aprender a desacelerar, a respirar, a parar. Fazer menos coisas com mais qualidade, sair desse vídeo clip alucinado. Ensinar às crianças, takes longos, intermináveis! Vida por viver!

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

A cidade das crianças

Quer uma pessoa melhor? Cuide da criança. Não tem novidade nenhuma nessa ideia. Educação, educação, educação, é tudo o que ela precisa para crescer forte, inteligente e saudável. Quer um cidadão melhor? Faça o mesmo. Eduque essa criança a conhecer e viver a sua cidade.

Estou nos Estados Unidos e sempre que venho pra cá fico impressionada com a diferença entre as nossas crianças, como elas se relacionam de forma diferente com o seu redor.Toda grande cidade americana tem uma grande variedade de equipamentos voltados para as crianças. Tem aquário, planetário, bibliotecas, Museu de Ciências, de História Natural, de Tecnologia, you name it! Isso quando não tem todos. Além disso, os museus de arte (e toda grande cidade americana tem um bom museu) têm programas, exibições, alas inteiras voltadas para as crianças. E todo mundo vai nesses lugares sempre, faz parte da vida delas. Vão com passeios da escola, vão com os pais, com a família. A criança vive a cidade.

Somado a isso, as crianças americanas andam pela cidade. Andam a pé, no carrinho, de bicicleta, de metrô, no ônibus escolar. São acostumadas desde cedo a conhecer as ruas, os trajetos, os vizinhos. Usam o transporte público. Olham as pessoas, sentem os cheiros.
A rua é o cenário das suas vidas e não algo que conhecem por trás de vidros pretos sempre fechados.

Como queremos criar pessoas comprometidas com mudanças e questões de mobilidade se nosso modelo é justamente o oposto? Carregamos nossos filhos pra lá e pra cá em redomas. Isolamos nossos filhos dessa experiência cada vez mais. Como uma criança que não se relaciona com a rua poderá se relacionar com a cidade?

Precisamos mudar urgentemente essa relação. Precisamos de pais mais corajosos, que deixem seus filhos saírem do ninho seguro para se aventurar pelo universo da cidade, explorar a diversidade da rua. Precisamos de cidades mais seguras. Precisamos ter a oportunidade de voltar pra rua. Crianças precisam conhecer seus bairros, precisam ir à padaria da esquina, precisam comprar jornal na banquinha, andar com os amigos, tomar um sorvete na esquina. Se quisermos um mundo mais humano, mais justo, mais criativo, vamos precisar muito dessas crianças no futuro. 

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Herança macabra

Esse é o ano dos filhos na nossa eleição. Nunca vi uma eleição tão familiar. Se somarmos aí, os netos, sobrinhos e afins, acho que temos uns 50% dos candidatos disputando o feudo. Filho de peixe, peixinho é, é isso? Então não voto em nenhum dos dois, nem no pai, nem no filho.
Qualquer pai que ache que a vida de político é uma coisa a se passar de herança pra seu filho não merece meu voto. Qualquer filho que cresça vendo seu pai na política e queira fazer isso da vida também não. 
Politica devia ser vocação, paixão. Conheço poucos, pouquíssimos que tem esse comprometimento. Fazer disso um negócio familiar, não me representa. Nunca pensei ver no Paraná essa tendência coronelista que tanto criticávamos quando ouvíamos as histórias das oligarquias nordestinas (sem preconceito) eternizadas no poder. Famílias que dominam a prefeitura, a câmara, a assembléia, o palácio do governo, isso era uma realidade distante. Não mais.
Obviamente temos exceções e famílias muito sérias na política, mas cá entre nós, são tão menoria que não devem chegar no 1% mesmo contando com a margem de erro para mais. Além disso, a renovação de pessoas na política é importante, revigora, transforma, areja.
Agora, trocar pai por filho, sei não, me parece um caminho perigoso. Infelizmente, vendo a quantidade de filhos e juniors sorridentes nos cavaletes, parece que é uma tendencia que veio pra ficar. 
Então cuidado, se a moda pegar, ou no caso eleger, podemos correr o risco de ter uma sociedade estagnada, onde nada muda. Depois dos filhos virão os netos, e por ai vai...
Como diria o Jamil Nakad, chega dos mesmos!


sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Poesia concreta e prosa caótica

O mundo se divide em dois grupos:  os que lêem (e presume-se que entendam) poesia e os que como eu, ainda não chegaram à esse nível intelectual. Morro de inveja de quem gosta de poesia. Acho o suprasumo da inteligência. Por outro lado, morro de preguiça de tentar me aventurar por esses caminhos densos E tortuosos da poesia.

Digamos que estou no nível Haicai, e com isso não estou desmerecendo o estilo. Não estou dizendo que seja menos nobre, fácil. Muito pelo contrário. Ser poético, inteligente e conciso pra caber numa estrutura tão pequena é o máximo dos máximos. Apenas reconheço que é nesse gênero que consigo ler e perceber toda a beleza.  Pra mim é poesia palatável, tem sabor, tem aroma, ritmo, genialidade. E por isso sou eternamente grata ao Paulo Leminski e à Alice Ruiz. Através do Haicai saí do analfabetismo poético ao qual estava sacramentada e condenada. Conheci sentido ocultos, descobri entrelinhas onde se pode colocar um mundo inteiro. Li e senti.

Acho que a capacidade de ler poesia é algo que a gente traz no DNA, uns são portadores desse gene, outros não. Meu pai é, minha irmã também. Fiquei de fora nessa divisão celular.

Geralmente as pessoas que lêem poesia tem uma sensibilidade diferente e levam a vida de forma diferente. São pessoas de alma poética e enxergam o mundo por esse prisma, profundo, intenso. Poesia inspira, abre os horizontes e as travas do pensamento, alimenta a cabeça para seus voos criativos, Dá um certo lastro. Isso tudo eu sei, mas ainda assim é difícil me deixar levar, abrir, ousar.
Meu pai e minha irmã são assim. De novo, fiquei de fora nessa divisão celular.

Tenho um jeito mais prático, mais pé no chão. Sou mais executiva, puxei definitivamente a minha mãe. Sou super concreta, nada poética no meu jeito de ver a vida. Mas cresci num ambiente com dois sonhadores, criadores, e isso de alguma forma também me influenciou. Dessa vez  eu peguei um pouquinho do vitelo. Estou mais para o famoso caso de poesia concreta e prosa caótica, como diria Caetano.

A criatividade sempre foi uma coisa importante em casa, talvez por eles terem essa bagagem, essa visão transformadora do mundo. Somos todos criativos, cada um a seu modo, e com seu propósito. O pai nas cidades, a Andrea na dança, a mãe criava programas pra melhorar a qualidade real das pessoas e eu olhando todos eles e absorvendo isso tudo. Eu geralmente gosto de fazer o trabalho das pessoas criativas. Se você coreografar, eu danço. Se você planejar, eu executo. Meu forte é achar maneiras criativas pras coisas saírem do papel.

Aprendi que gente que vive sonhando em transformar coisas, uma hora consegue.





terça-feira, 9 de setembro de 2014

O Rio de Janeiro continua lindo!

Passar três dias no Rio de Janeiro é um bálsamo pra qualquer pessoa. Passar três dias no inverno é um bálsamo pra qualquer Curitibano!
Temperatura em torno dos 21,25 graus, o Rio no inverno é a melhor praia do mundo. Primeiro, como pros cariocas essa temperatura é glacial, digna de tirar botas e casacos de couro do armário, eles não vão muito à praia nessa época. Fica uma praia tranquila, sem muvuca. Tem lugar pra cadeira, da até pra estender a canga pra deitar de costas. 
Segundo, para nós, praticamente moradores do Pólo Sul, 25 graus é perfeito, sol sem aquele efeito tostador que nos deixa com o lindo tom de rosa na pele. É o melhor dos mundos, sol sem torrão! Quase nem precisa passar protetor solar, tirando o rosto, é claro.
Gosto de ir pro Rio, tento respirar ao máximo esse ar leve e descontraído até encher as reservas pulmonares. Gosto de comprar as roupas soltas e coloridas, as sandálias baixas. Uma moda que reflete esse clima solar e alegre tão diferente dos nossos casacos pretos e nossos dias cinzas. Tomo sorvete, muito suco de fruta nas esquinas. Como saladas sem sofrer pra me esquentar. Ando pelas ruas do Leblon à pé, pra lá e pra cá sem carro.
O carioca é  um curitibano do avesso. Somos o reverso da medalha dos cariocas. Onde nos somos formais, eles são extremamente amigaveis. Onde somos sérios, os cariocas são alegres e brincalhões. Onde somos moderados, eles são expansivos. E por aí vai. Deveriamos incentivar casamentos entre essas duas espécies, dariam ótimos filhos, ótimos brasileiros. Já pensou? Gente certinha mas bem humorada, gente com a nossa tão falada seriedade mas com a boa pracise dos cariocas. Só não pode trocar as qualidades! 

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Misofonia

Graças ao Fantástico da semana passada, descobri uma nova característica em mim, sou misofônica! Alguns são intolerantes à lactose, outros ao glúten. Eu não, meu estomago aguenta tudo, já os meus ouvidos..... Sempre tive um ouvido super afiado, tenho facilidade para línguas, tenho facilidade para entender música, só não tenho tolerância para barulho. 
Agora sei o nome do que me faz ser a chata do cinema que fica fazendo shhhhh pro pessoal que tá conversando lá na última fileira: misofonia. Agora sei porque o barulhinho imperceptível dos motores de todos os aparelhos eletrônicos, mesmo o do relógio digital me dão nos nervos: misofonia. Agora sei porque gente mexendo em papel de bala, batendo lápis na mesa, mordendo caneta, fazendo pequenos mas sonoros movimentos com mãos ou pés, me tiram do sério: misofonia. Agora sei porque a dublagem dos programas de televisão me perturbam de tal maneira: misofonia. Agora sei porque me irrito quando escuto o som que sai dos fones de ouvido dos outros:  misofonia.
Não sou intolerante, tenho uma intolerância. É bem diferente.
Quem não tem esse problema não tem noção do quão perturbador esses pequenos ruídos são para gente como eu. Parece que as pessoas estão fazendo esses barulhos dentro da cabeça da gente. Eles são altos e irritantes demais pra quem tem essa intolerância. Não dá pra esquecer, não dá pra abstrair, não dá pra pensar. Os sons preenchem o espaço de uma maneira nada agradável, é realmente um sofrimento. Não é exagero, é misofonia.
Pelo que vi no Fantástico, até que sou uma misofônica bem tolerante pois não deixo de fazer nada e e não me isolo no mundo por conta desse problema. Vou vivendo do jeito que dá, rodeada de barulho por todos os lados.
Quem tem intolerância alimentar pode se cuidar, corta os produtos, tem controle sobre seu problema. Quem tem misofonia está condenado a um sofrimento pior. Não podemos silenciar o outro. Não podemos tirar do mundo esses milhões de pequenos sons que nos perturbam, não podemos desligar ou abaixar o volume do planeta. Não temos controle sobre nossa deficiência, só podemos, de vez em quando, reclamar, pedir, implorar pela compreensão e educação alheia.
Quem é misófono sabe o quanto as pessoas são mau educadas e o quanto não pensam no conforto sonoro dos outros. É gente demais fazendo barulho demais. Gente falando alto no celular em qualquer lugar, gente que grita, gente que tamborila na mesa em reuniões, gente que batuca na mesa na aula, barulho, barulho, barulho!
E olhe que já não escuto mais como antes, décadas de shows e muito walkman já fizeram seus estragos. Nem por isso a misofonia atenuou. Posso não ouvir o que você está me falando, mas se você estiver batendo seu pé no pé da cadeira, vou ouvir cada toque como se fosse um tambor dentro de mim. Não podia ser ao contrário?
A misofonia se relaciona a forma do barulho. Ainda não sei como chamar a intolerância quanto ao conteúdo do barulho. Tenho também, há tempos, intolerância a discursos retrógrados, racistas, burros, preconceituosos, descriminatórios. Seja qual for o nome dessa modalidade, em época de campanha eleitoral, ela vai ás alturas!!!!!




quinta-feira, 28 de agosto de 2014

365 dias depois....

Um ano escrevendo, um ano! Comecei esse blog num impulso, na vontade de colocar pra fora pensamentos que as vezes não cabiam mais em mim. Comecei no maior gás, tudo era motivo para uma história. Maior adrenalina. Os textos pareciam uma enxurrada, montes de coisas pra contar que iam se soltando quase sem o meu controle. Um descarrego!
Com o tempo as coisas foram mudando, não dava mais pra escrever com a mesma assiduidade. Comecei a pensar com mais e mais atenção no que falar, ter um pouco mais de auto crítica, uma busca por fazer mais e melhor. Alem disso, a vida que vai nos levando, a correria do dia a dia, um pouco de preguiça também -confesso, tudo ia mexendo com a minha disponibilidade de sentar e escrever. Mas sempre procurei manter o fluxo, não quebrar o encanto. Achar o tema certo e contar o que penso.
Minha cidade e um pouco da minha vida estão aqui. Mais que isso, muito de mim está aqui. O que penso, o que gosto, o que me anima e até o que me incomoda. Coisas e pessoas que me inspiram, momentos bons para serem recontados e recordados. Lembranças queridas e algumas saudades. Tá tudo aí.
Foi um grande desafio. Passar pelas barreiras e pelas vergonhas.  Achar o tom certo, o tema interessante, ter algo novo a dizer. Nem sempre foi fácil, mas foi sempre divertido. E esse é o grande lance. Foi um prazer no melhor sentido que a palavra tem.
Por o ponto final, teclar enter e esperar o primeiro like, Essa expectativa de ver quem ia ler, quem ia curtir, quem ia comentar não tem como descrever. E tive sempre os melhores e os mais bacanas leitores, meus amigos. Muito carinho, muito incentivo, muito tudo de bom foi o que recebi nesse ano. Escrever pra quem nos conhece é um tanto amedrontador, como é dançar sabendo quem está na plateia. Mas ao mesmo tempo, é mais instigante. Adoro saber o que vocês pensam dos textos, cada um de vocês. Por que como sempre digo, esse blog não é nada mais nada menos que uma grande conversa que gostaria de ter com todos.
Então ai vai, mais uma vez, as palavrinhas alinhadas. Dessa vez é só um agradecimento, um super muito obrigado pra todo mundo que abriu seu tempo pra aparecer por aqui, ler e me acarinhar com a sua leitura.
Esse blog foi uma bela viagem, e agradeço do fundo do coração (meu deus! não acredito que escrevi essa que deve ser a frase mais clichê do mundo!!!!!) quem se sentou ao meu lado, mesmo sendo do outro lado do mundo e da tela do computador.
As letras tão ai, alguns erros de ortografia também, o pensamento é meio imperfeito,  mas a alegria é imensa!


sábado, 16 de agosto de 2014

Questão de gosto

Deveria existir uma comissão de estética em todas as cidades. Este deveria ser o órgão mais rigoroso da administração pública. Me dói na alma ver a quantidade de prédios de gosto pra lá de duvidoso que pipocam pela cidade. 
Sou muito ciumenta da minha cidade. De verdade. Cada cantinho de Curitiba é como se fosse, e é, a minha própria casa. Por isso, cada vez que vejo a especulação mobiliária ganhar num terreno, é como se eu tivesse pessoalmente perdido a guerra. Cada casa que se vai é uma ferida. E tem algumas que não cicatrizam jamais. 
Por isso precisaríamos minimizar as perdas. Já que não podemos deter o progresso (progresso?) pelo menos deveríamos ter algum controle estético sobre o que irá compor nossa paisagem urbana. São tantos os estilos arquitetônicos que vemos invadir nossos olhos, tantas invencionices e modernices... Botar a baixo uma casa do Lolô Cornelsen para erguer um monstro neoclássico deveria ser punido com prisão. Alguém deveria ter o poder de nos poupar da feiura e da degradação urbana. Alguém da secretaria de urbanismo além de conferir metragens e normas de recuo, deveria poder dizer: "essa feiura, na minha cidade, não pode!" Simples assim.
Uma das coisas que mais gosto em Curitiba é poder ver o céu, quase sempre, de qualquer ponto da cidade. E isso também quer dizer ver o azul intenso do inverno, nuvens improváveis, o por do sol vermelho, a chuva chegando e a lua cheia nascendo, só pra listar os fenômenos naturais. Olhar o céu da cidade nos faz ver as coisas com amplidão, podemos ter a visão maior das coisas, literalmente. Cada prédio novo no horizonte nos toma esse direito. A cidade vai perdendo a sua perspectiva, nosso olhar fica cada vez mais restrito, encolhido. Nosso céu, um quadradinho.
Por isso deveríamos ser mais zelosos com o que nos ofertam. Cada edifício, cada shopping, cada nova intervenção, cada viaduto. São obras perenes, merecem muita, muita atenção.
Uma ponte estaiada aqui, um elefante branco ali, prédios desenhados sem amor acolá e lá se vai nossa cidade afundando num mar de degradação que não tem volta. 
Arquitetos e engenheiros, autoridades e prefeitos que me perdoem, muitos me chamarão de atrasada, censora, retrógrada. Aceito a crítica e os predicados. Só peço atenção, bom senso, carinho pelo trabalho. Fazer e aprovar prédios é mais que encaixar cômodos em metros quadrados cada vez mais exímios. Vocês tem uma responsabilidade muito maior, vocês estão mexendo com a paisagem urbana. Mais que isso, vocês estão mexendo com a minha casa.
Sejam corajosos, modernos, ousados, não sou contra nada disso, não me entendam mal. Mas tenham qualidade, propósito, beleza.
Assim ganharíamos todos. Assim um novo prédio poderia honrar a antiga casa. Assim obras novas não nos deixariam com aquele gosto amargo na boca. Assim o caminho do olhar até o céu poderia ganhar novas e belas molduras.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Liana vai ao teatro

Ontem levei minha filha de 12 anos no seu primeiro teatro "adulto". Como ela está crescendo do dia pra noite, resolvi que esse ano, a gente já podia mudar o foco dos nossos programas culturais. Saem os desenhos animados, que eu secretamente também adoro,  e entram filmes, livros, peças e ballet de gente. Ainda passo na sessão infanto-juvenil, mas não necessariamente. Acho mais legal ir direto em coisas mais abrangentes, não tão preparadas e moldadas para o gosto dos adolescentes. Quero que ela comece a ver o mundo de verdade, sem esse filtro as vezes limitante do universo pré-fabricado para ela. Quero que ela tenha que fazer um esforço extra , puxe um pouquinho mais, saia da zona de conforto e possa entender ou não, gostar ou não, sentir ou não, mas experimentar um pouco da vida lá fora.
Então, a peça  foi escolhida a dedo, para que ela entre com o pé direito nesse universo tão delicado e as vezes tão fechado e difícil que é o teatro. Fomos ver Tchekhov, da companhia Ave Lola. Escolhi a peça por que ela é feita com uma delicadeza que me emocionou muito na primeira vez que eu a assisti, uns tempos atrás. Tudo na peça é muito bem pensado, muito bem feito, muito pertinente e muito inspirador. Da linguagem corporal à maquiagem, do texto à música, do cenário ao próprio espaço cênico, Tchekhov é uma deliciosa viagem que essa trupe da Ave Lola nos proporciona.
Trupe no melhor sentido da palavra, de gente comprometida, que transformou um antigo casarão do São Francisco no teatro mais simpático de Curitiba, o Ave Lola Espaço de Criação, onde os 50 sortudos espectadores são recepcionados com a alegria da Ana Rosa Tezza, diretora da peça e coordenadora do espaço. Tem deck, tem rede, tem pomar, tem jardim com almofadões coloridos que fazem da espera, do intervalo e da saída um prazer. Tem vinho, tem pão, tem bolo, cafezinho, no frio tem sopa, tem gente pensando em fazer você se sentir em casa. 
Na peça, os oito atores (Evandro Santiago, Helena Tezza, Janine de Campos, Marcelo Rodrigues, Regina Bastos, Tatiana Dias, Val Salles e Vida Santos) se desdobram em múltiplos personagens. As trocas de figurino e maquiagem são incríveis e acontecem diversas vezes pois os personagens vem e voltam, exigindo o dobro de trabalho. As transformações são além do visual, os atores mudam tanto que eu tive a sensação que um deles até muda a cor do olho. Tem música ao vivo, nas mãos da dupla Fabricio Amaral e Matheus Ferrari. O cenário é simples e a linguagem cênica nos faz ver cavalos, trens, florestas, rios, estradas, cidades, teatros num palco do menor do que a sala da minha casa. O texto fala obviamente de teatro, mas fala de muitas outras coisas nas entrelinhas, abrindo ai um leque de sentimentos.
Enfim, Tchekhov é encantamento, e fiquei feliz que a Liana vivesse isso. Na saída ainda fomos brindadas com um bate papo informal com a companhia toda. Todo mundo espalhado pelo deck, conversando sobre o processo de criação do espetáculo, matando a nossa curiosidade. 
Por isso eu recomendo, vão lá, se apressem, essa segunda temporada acaba logo logo. Cheguem cedo, curtam o lugar, deixem o celular em casa, se emocionem.  Mandem um beijo especial ao meu personagem favorito, o doce Chapula e bom espetáculo!

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Aumenta que isso aí é Rock'n Roll

Dia desses assisti ao programa que comemora a entrada das bandas  escolhidas para o Hall of Fame do Rock'n Roll 2014. Sensacional! 
Funciona assim, vem uma pessoa que tem a ver com a banda indicada e faz uma apresentação dela. A banda recebe o prêmio, faz os discursos de agradecimento e dai, sonzeira, bota sonzeira nisso!! 
Como a indicação tem a ver com o conjunto da obra, não tem quase ninguém com menos de 50 anos recebendo o prêmio. Garotada só entra fazendo a homenagem ou como convidados da banda em questão. Repito: sensacional!
Primeiro por que geralmente estamos falando de bandas que eu conheço e que fizeram a trilha sonora da minha vida. Gente que está há mais de 30 anos na estrada. Bandas que são quase míticas, as que a gente colocava o pôster na parede do quarto. 
Alguns músicos já não estão mais nesse plano. E pra esses fica sempre o gosto de uma perda irreparável. Fica a homenagem. Ainda que tardia.
Mas tem a turma que ainda está na ativa e tem algumas bandas que só voltam a tocar junto nessa festa, e dai a coisa fica realmente bacana.
Roqueiro é sempre roqueiro, e é divertido ver como eles abraçam a chegada dos anos. Tem camiseta rasgada, jaquetas, coletes e calças de couro, mas também tem ternos bem cortado. Tem muito cabelo comprido, bandana, chapéus, mas tem algumas carecas e cabeças grisalhas. Tem mães orgulhosas na plateia, mas tem filhos e netos também.
Os discursos são lindos, tanto os das homenagens quanto das bandas emocionadas. Mas ver seu ídolo se apresentar é a grande diversão da noite.
Matas as saudades de 20, 30 anos. Ouvir aquele hino da sua juventude, mas sobretudo sentir a energia dessas bandas no palco é incrível. Estamos falando de bandas que mudaram o mundo da música, inventaram estilos, e elas sobem no palco e é magia pura. Baterias no auge, solos irretocáveis das guitarras, metais, teclados, baixos, vocais que retumbam. Tá tudo lá em arranjos caprichados, as vezes idênticos ao original, alguns melhorados ainda mais. Barulho, muito barulho, como todo roqueiro gosta.
Aí a gente vê como a música é uma coisa poderosa. Não importa a idade, nem a nossa, nem a deles, somos todos transportados pra um lugar sem tempo, só emoção. A música ressoa dentro da nossa memória, traz imagens, cheiros, pessoas, momentos. A música impulsiona, energiza, emociona. E por isso mesmo essa homenagem é tão legal. Reconhecer o que essas bandas representam é retribuir por todos esses sentimentos. É puro carinho.  E barulho, claro, muito barulho!

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Com brasileiro não há quem possa

Tá bom, tá bom, vamos falar sobre a copa. Tecnicamente essa é a minha 12a. Copa do Mundo de Futebol. Tirando a de 58 e a de 62, estava no planeta em quase todos os títulos do Brasil. Mas só me lembro das Copas de 82 pra cá, e olhe lá!
A copa de 82 foi a mais marcante de todas. Na minha lembrança, o país inteiro era um só, todo o mundo muito confiante na melhor seleção do mundo que era a nossa. Como não ficar? Tele Santana no comando e Valdir Peres, Leandro, Oscar, Luisinho, Júnior, Cerezo, Falcão, Sócrates, Zico, Serginho, Éder, Paulo Sérgio, Carlos, Edevaldo, Edinho, Juninho, Pedrinho, Batista, Paulo Isidoro, Dirceu, Renato e Roberto dinamite. Ouro Puro!!!! Tá bom, o Valdir Peres dava um certo medinho na gente, mas era um timaço. Com 13 anos, foi a minha primeira Copa, a primeira vez que eu chamava meus amigos pra assistir aos jogos juntos, decorar a casa, comprar camiseta, uau! Foi também o maior sofrimento, morremos um pouco naquele dia fatídico e não posso ouvir o nome do Paolo Rossi sem ter um arrepio na espinha.
Ai veio 86, outra vez o país inteiro se vestiu de verde amarelo, outro timaço, vários hinos, emoção pura no ar. Acho que essa foi a seleção mais amada do país. A esperança de vingar os craques de 82 estava no ar. Tudo de bom! Os jogos começaram é era um jogo melhor que o ouro, a seleção ia melhorando a cada jogo. Sensacional, com 17 anos, já podia comemorar na Batel, onde a cidade inteira ia festar depois de cada vitória, festa espontânea, na rua, lindo de ver! Mas veio a França, e... não posso nem falar sobre isso. Luto total!
Da copa de 90 confesso, não me lembro de nada, absolutamente nada, nem onde ia, nem quem jogava, nada, acho que o pais estava tão traumatizado que nem conseguiu se envolver com a seleção do Lazaroni (santo Google).
E veio 94! Minha primeira Copa do Mundo já casada. Tínhamos um timaço de amigos assistindo aos jogos juntos, mil mandingas e superstições, toso mundo senta no mesmo lugar com a mesma camisa. O país estava pronto pra gostar de outra seleção. E essa seleção tinha uma cara bem brasileira, com o Romário como símbolo maior desse nosso jeito gaiato. Foi uma Copa boa de ver, com muita emoção, jogos sofridos, alegria imensa nas vitórias. Final nos pênaltis, haja coração! E quem poderia sonhar que a taça viria das mãos do temeroso Taffarel que virou um gigante na defesa do pênalti. E teve a ajudinha do Baggio! Foi a copa que mais curti!
A Copa de 98 deixou um gosto amargo na boca. Depois de idas e vindas, a gente finalmente conseguiu gostar e confiar nessa seleção. Veio a final, todo mundo com o grito na garganta, tudo pronto pra festa! Não dá nem pra descrever a sensação com o que vimos naquele jogo. Até hoje é meio surreal a participação do escrete canarinho naquele campo. Foi a Copa da desconfiança. A Copa das suspeitas. Foi a Copa de cair na real e ver que alguma coisa de podre rondava o nobre reino da FIFA.
Em 2002 eu vi muitos jogos enquanto amamentava a minha segunda filha nas madrugadas geladas de Curitiba. Copa família, família Scolari. Felipão conseguiu fazer a gente torcer de novo pra essa meninada. Foi quase um fazer as pazes com o futebol. Voltar a acreditar na alegria.  É tetra! Quem mais no mundo??!!!
Por mais que sejam mais recentes, as Copas de 2006 e 2010 se misturam muito na minha memória, talvez por não ter acontecido nada marcante, nenhum grande craque, nenhum grande jogo, nenhuma grande polêmica, elas passaram meio em branco. Perdemos e pronto, lembrar-se do que?
Aí a copa veio pra casa e o que seria a glória virou um pesadelo. A Copa trouxe de bom só uma coisa, o despertar do cidadão brasileiro para o seu país real. Lindo de ver!!! Ninguém jamais iria imaginar as manifestações de Fora Copa justamente no Brasil. E sem entrar em muita polêmica e já que ela tá ai mesmo, esse despertar fez essa Copa ser especial.

A sensação que eu tenho é que a gente nunca mais a gente vai se entregar de amores por uma seleção. Nunca mais o país inteiro em verde amarelo. Já vimos muito, sofremos muito, estamos escaldados. Mas claro que se o Brasil estiver lá no Maracanã, na final, vou chorar e sofrer e torcer como nunca. É a Copa dos meus filhos, quero que seja mágico pra eles. A pátria vai estar de chuteiras, que venham os gols!

terça-feira, 8 de julho de 2014

Sete da manhã na ciclovia

Gente super agasalhada, chapéus, gorros e bonés, algumas luvas. Roupa de ginástica combinando, camisetas de propaganda e de corrida, tênis de todas as cores, Calça jeans e sapato. Algumas sombrinhas, gente de bolsa! 
Bike ultimo tipo, ciclistas equipados, mochilas de marca, capacetes, espelhinho, luzinha, garrafinha, GoPro e bermudas justas de lycra. Bicicleta podrona, sacolinha de mercado, as vezes com vassouras e cortadores de grama, as vezes com garrafa térmica e mala antiga de cursinho, radinho de pilha na cestinha. Bici moderninha, dobrável, óculos de aro preto, roupa de trabalho, bolsa. Bici com criança na garupa, mochila da escola, mãe de trança no cabelo e saia comprida.
Ipês roxos, amarelos e rosas. Azaléias em flor, hortências já queimadas, hibiscos laranjas, botoes da próxima florada. Verdes de todos os tons, fibras das paineiras, sementes, espinhos, folhas secas, árvores cortadas no formato do trem. Ameixas amarelas ainda verdes, , amoras em projeto, pitangueiras preguiçosas, bananeira que vai tomando conta com cacho de banana alto que não se alcança.
Casas bem guardadas, jardins cuidados, muros baixos, reformas, caçambas. Lojas, predinhos, arquiteturas de todos os estilos, tijolinho, janela com cortina. Lambrequins!
Cachorros de todas as raças, do lado de dentro, do lado de fora, com coleira e dono, livres e em bando. Alguns gatos nos muros e janelas, muitos sabias. Um periquito.
Carros que dão passagem, sinais que demoram, travessias sinalizadas em vermelho, ciclistas que passam zunindo, muito perto. Asfalto, buraco e ondulações, poças de água e lama, fendas, pedras. Pichações e grafites de arte duvidosa, marcações de quilometragens, recados, declarações de amor e de ódio. Cães perdidos, fretes, sorte, massagistas, aulas particulares, placas e sinais. Propaganda, 
Neblina, garoa e nuvens. Vento gelado, raios de sol. 
Gente saindo pro trabalho, vigias deixando o turno, fumaça de carro a álcool, gente cortando o caminho, celulares, pontos de ônibus cheios. Banca de revista animada, mesinhas e cadeiras, aparelhos de ginástica recém inaugurados. Gente dormindo e acordando, colchão só na espuma, cobertor esfarrapado, fogueira e canequinha.
Gordos, magros, altos e baixos. Rabos de cavalo, cabelos grisalhos, ipod e fone branco, suor. Corredores compenetrados, gente que só anda, gente que diz bom dia, gente que passa reto, conhecidos de antes, conhecidos da caminhada. Duplas animadas, amigas fofocando, casais discutindo, personal e aluno.
Hoje foi assim!






quinta-feira, 3 de julho de 2014

Eu uso óculos

Pois é, uso óculos desde os meus dois anos de idade. Isto quer dizer, uso óculos há muuuuito tempo, minha vida inteira, praticamente. E odeio. Sempre odiei.
Meu quadro é crítico, eu tenho praticamente todos os problemas que uma pessoa pode ter na vista. Hipermetropia, astigmatismo, estrabismo, olho preguiçoso, olhos com visão diferentes... e agora pra completar, entrei no maravilhoso mundo da presbiopia. Um feito e tanto!
Já usei todo tipo de óculos que você pode imaginar que já criaram. Redondos, quadrados, acetato, tartaruga, metal, finos, grossos, retrôs, transparentes, coloridos, pretos, gatinho, fininho, tudo! E comprar óculos sempre foi um suplício. Decidir com que cor ou formato você quer colocar no seu rosto por pelo menos um ano todo, é um horror. E tem mais, quando vou experimentar os óculos na loja, não enxergo nada, é o ó!
E as lentes.  Como sou esse turbilhão de problemas e pra colaborar, meu grau nunca baixou de 5 positivos, eu sempre usei aquelas lentes grossas, mesmo com o advento das hiperlights e afins. Pode ser antireflexo, antiriscos, transitions, nada disso me deixa feliz. Agora entrei  no mundo multifocal. Enfim, você poderia contar a história da evolução das lentes pelos meus óculos.
Um dos meus antigos óculos, numa foto feito pelo meu querido oftalmologista Mauricio Brik
De uns 20 anos pra cá, comecei a usar lentes de contato e aí também já fiz a romaria das lentes. Duras, gelatinosas, fluorcarbonadas,  até chegar nas queridas descartáveis.
Usar lentes foi uma mudança enorme na minha vida. O óculos é uma coisa que nos marca muito, é um peso e uma marca na sua cara. Alguns gostam, acham que é um acessório, que embeleza, que imprime um estilo. Nunca foi o meu caso. Usar óculos sempre foi uma coisa que me incomodou e as lente de contato foram como se eu saísse de uma prisão. Usar lentes, pra quem usou óculos durante uma eternidade, é como tirar uma moldura na minha cara, literalmente.
Infelizmente, sou super alérgica e as vezes tenho que dar uns tempos das minhas lentes, e com essa nova presbiopia maledeta, tenho que usar óculos para ler mesmo quando estou de lente. É o fim! Essa foi a pior notícia da vida. Quando finalmente estava livre e feliz, vem essa história? Vocês não imaginam como eu perturbo o meu oftalmologista. "Não dá pra mudar um pouquinho, aumentar o grau aqui, tirar dali?" Faço tudo pra não usar óculos. E se você me ver franzindo a testa pra ler, já sabe o que está acontecendo.
Mas sem dúvida usar óculos é uma coisa que nos tranforma. Só quem usa sabe. E para quem sempre usou é ainda uma coisa mais profunda. Posso dizer que usar óculos é quase como uma parte da minha personalidade. Vejo o mundo por trás de lentes e acho que isso me fez sempre ser muito observadora. Gosto de ver o mundo por trás das coisas, gosto de olhar. Acho que a minha dificuldade para simplesmente ver, me fez gostar muito de enxergar e quero sempre enxergar as coisas com muita atenção. Ver e descrever. E aqui estou eu, vendo e descrevendo com meus 6,5 graus atuais, no meu óculos multifocal preto, enquanto não acerto o grau da minha lente.


quinta-feira, 26 de junho de 2014

Canal da bola

O jogo foi 2 x 1. Fulano e Beltrano marcaram pro time A, Sicrano marcou pro time B. O time A ganhou. Ponto final, certo? Nunca!
Uma partida de futebol nunca acaba no apito final. O jogo ter terminado é só um detalhe. Ele se perpetuará por mais uma eternidade nas centenas de milhares de replays das melhores jogadas,  milhões de comentários no facebook, trilhões de programas que discutem sobre futebol.
Não sou aficionada por futebol, mas até gosto de ver um joguinho aqui, outro no mês que vem, tirando a época da Copa que contagia até a mais cética das torcedoras como eu. Agora programa sobre futebol, tenham a santa paciência!!!!! Talvez porque eu seja mulher. Pra mim é  dificílimo entender o por quê de tanta falação sobre o jogo Ele acabou, ninguém vai conseguir mudar nem o resultado, nem a atuação, nem o esquema tático, nem coisa nenhuma. É um festival de gente dando aula de futebol, mostrando a sua vã sabedoria, querendo comprovar teorias. Que saco!
Que tanto tem de interessante nessa falação toda? Acho que o futebol é o momento. Chutaram? Acertaram? É gol, simples assim. Alegria e tristeza, tudo em 90 minutos de emoção. Não tem explicação, as coisas acontecem ou não. Essa é a graça, a bola na trave, o impedimento duvidoso, a raça do atacante, a violência do zagueiro, o gol, tudo ali, acontecendo ao vivo e a cores para todo o planeta.
Você alguma vez viu um programa, uma mesa redonda televisiva sobre uma peça de teatro? Ou um balé? Ou sobre qualquer outra manifestação cultural fora o futebol? Não estou falando de crítica, estou falando nessa forma sistematizada, regular, as vezes diária, de discussão do futebol.  Já pensou? Toda segunda, na rede xxx, programa Cena Aberta, ou Sapatilha Vermelha, ou Capitulo Final  (pra manter o padrão dos nomes esdrúchulos que esses programas tem). Agora vamos discutir por que o violoncelo da orquestra não entrou no movimento certo ou sobre o valor do passe do Maestro. Hoje o comentarista Tal vai explicar o uso do cenário como parte efetiva na compreensão do texto do Nelson Rodrigues. Pode isso, Ana Maria Botafogo? Inimaginável! Por que será? 
Será que a cultura é menos importante que o futebol? Nesse país das chuteiras é bem possível.
Mas acho que na arte essa questão do momento, do sentimento é aplicada automaticamente. Ninguém vai assistir a um bando de gente debatendo sobre coisas que você pode ou não ter sentido, entendido, gostado. Arte e a percepção da arte é algo muito pessoal e completamente subjetivo. Ainda bem! Não quero ninguém tentando me ensinar a me emocionar com esse ou aquele texto, não quero ninguém criticando a música que eu adoro. Não quero explicações do porque Treze gestos de um corpo é tão lindo!
Só nos resta pedir ao Santo Protetor da TV a Cabo para que nos dê em dobro, em arte, cada canal de falação esportiva. Amém!




terça-feira, 24 de junho de 2014

Cade a Copa?

Ok, ok, vou falar de futebol! Morando no pais do futebol, na época da Copa das Copas, eu até que resisti bravamente por duas semanas! Deve ser porque eu moro no Cabral.
Para quem não mora em Curitiba eu explico: o Cabral fica na região norte da cidade e aqui não tem Copa. Não temos hotéis, não temos a Arena, não tem turista, não tem ônibus de seleção, não dá pra perceber nenhuma mudança no nosso pacato dia a dia. Nada, absolutamente nada acontece por aqui que nos faça lembrar que somos uma das cidades sedes do maior evento futebolístico do país. A Copa não conseguiu passar da praça Rui Barbosa, centro centralíssimo da cidade.
Mas isso não quer dizer que a Curitiba a não esteja aproveitando a Copa. Quem mora nos arredores da Arena da Baixada está tirando a barriga da miséria. Eles tem tudo, os sortudos. E tem a Pedreira Paulo Leminski, sede da Fun Fest, uma bolha de Copa numa região que fica longe da muvuca oficial.
Ontem, pra que meus filhos tivessem a dimensão do que é receber um evento desse porte. Tive que ir pegar a saída do jogo entre Espanha e Austrália. Fui passear de carro na região limítrofe ao permitido, pra ver a bagunça e o colorido da galera e dos turistas. Muito legal. Vimos milhares de pessoas fantasiadas, pintadas, num mar de camisetas amarelas da Seleção Canarinho dos locais e as dos simpáticos australianos. Milhares de bandeiras, bandanas, cornetas, perucas, cocares e camisas de todos os times possíveis e imaginários. Aquela alegria dos grupos de amigos, pais e filhos, todos com aquela cara de "eu fui". Adorei e morri de inveja. Queria ter a minha rua bloqueada no dia do jogo, queria ver da janela o zumzumzum da galera indo pro estádio. Queria tirar fotos do ônibus da Nigéria, queria tentar um autógrafo do Piqué no restaurante do lado de casa. Queria sentir esse frisson de participar do evento, viver o evento na pele, ou pelo menos no endereço. Mas, no Cabral não tem copa, fui geograficamente isolada da folia. Minha única salvação é tentar ir no último jogo aqui em Curitiba, quem sabe ainda consiga ingressos, estou tentando. Ai sim vou me sentir parte da galera, vou poder tirar minha selfie e me gabar no facebook!


quarta-feira, 18 de junho de 2014

Perca-se

Pequenas cidades são o máximo. Adoro a vida e as pequenas delicadezas que só as cidades pequenas têm. Elas são cheias de tradições e peculiaridades que só quem morou numa sabe descrever. Aquela festa que todo semana reúne quase a população toda em volta do coreto da praça. O açougue que não muda a produção, mesmo que às 10 da manhã uma fila enorme de moradores fique sem a linguiça sensacional que simplesmente acaba. As comidas típicas, os lugares folclóricos, as cachoeiras escondidas, os hoteizinhos charmosos, as trilhas de aventura, os personagens, a atmosfera.
Ao contrário do que possa parecer, as oportunidades nesses lugares são imensas. Pelo menos poderiam ser. Fora do Brasil, a gente paga horrores para passear por lugarejos tão pequenos que às vezes nem estão no mapa. Quem não sonha com a Provence? Quem não quer ir pra Toscana? Quem não se encanta com os Pueblos Blancos espanhóis? 
E aqui poderia ser igual. Não nos faltam belezas naturais, não nos faltam regiões polo produtivas. Não nos falta talento nem qualidade. Falta incentivo, apoio, divulgação. Falta um pouco de charme, confesso, mas tudo poderia ser tão bacana quanto nesses invejados roteiros estrangeiros. 
Graças a nossa multiplicidade étnica, tempos de tudo, é só potencializar o que já está sendo feito de forma amadora e independente em diversas regiões do país. Os produtores artesanais teriam que incrementar seus produtos e embalagens, investir em pontos de vendas mais charmosos. As prefeituras incentivar esses pequenos negócios, criar roteiros de charme, investir na divulgação, agrupar produtores, reconhecer as vocações das suas cidades. O governo deveria ver nessas oportunidades como um projeto bem feito poderia salvar a economia de lugarejos sem outra fonte de renda.

Na sua próxima viagem, saia da estrada principal, pegue aquela estrada de terra, conheça o mundo que se esconde às vezes a menos de 50 quilômetros da sua casa. Perca tempo, encontre belezas e se esbalde nas delicias que vai encontrar.  O bolso pode até ficar vazio, mas o porta malas voltará cheio e a vida ficará muito mais feliz. 

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Távola redonda

Nada mais legal que juntar gente ao redor de uma mesa. Qualquer gente, qualquer mesa, sempre é um programa legal. Mas é mesa de comer, não de reunião.
Ultimamente tenho estado em várias mesas. E tenho participado de diversos grupos, o que torna tudo ainda mais legal. Família grande, amigos antigos, turma do escritório, pessoas novas, como é bom! 
E não é só o comer em si, toda a preparação, já é uma festa. O Whatsapp tornou a preparação de qualquer encontro num grande e divertido acontecimento. São milhares de mensagens combinando cardápio, presenças, roteiros, tudo vira motivo pra gente se fartar de rir.
Um desses grupos que participo, que se reunia eventualmente para almoços já virou grupo de viagem. O mais bagunceiro que se possa imaginar. Outros são comemorativos, podem ser reuniões de gente que não se vê há muito, aniversários. Tudo é um pretexto pra colocar quem se gosta ao redor da mesa.
As vezes, a comida é a grande atração da noite. Receitas de família, a que você aprendeu recentemente com um chef renomado, o prato preferido do amigo, o  nervoso de preparar pra tanta gente, o restaurante novo que tem que conhecer.  A estrela também pode ser a bebida, uma degustação, um achado no mercado, aquela safra maravilhosa, uma preciosidade para se dividir. Comida e bebida  que confortam, que desafiam, que surpreendem, que aquecem o coração. 
Mas a mesa é o lugar mais importante, é o ritual mais antigo e mais bacana de todos. Sentar em volta de uma mesa, de preferência sem hora pra acabar, pra dividir a comida e muitas vezes a vida é simples e imbatível. Você pode até ganhar alguns quilinhos, mas vai ganhar também as melhores lembranças e momentos. Vai rir de se acabar, vai ser pedida em casamento, vai anunciar uma viagem, um filho, vai lembrar daquela vizinha, vai contar sobre a doença, vai discutir com alguém, vai planejar a próxima viagem, vai saber o que aconteceu na novela, vai descobrir as notas dos filhos, vai ver se a grana dura até o fim do mês, vai saber das novidades, vai apresentar alguém, vai chorar de emoção, vai passar as fotos, vai trocar endereços, receitas, dicas, simpatias, livros, vai falar do vestido da fulana, vai saber do melhor filme da semana, vai se encantar, vai se lambuzar. E falar e falar e falar...
A mesa é isso, um grande mercado onde você vai compartilhar e receber. Compre os ingredientes ou faça uma reserva, chame a tropa, abra o vinho e gele a cerveja, o melhor da vida vai ser servido. Cheers!



sexta-feira, 30 de maio de 2014

Amizades Hereditárias

Coisa boa na vida é que além de fazer amigos a gente também herda alguns, e deixa alguns de herança. Tenho um monte de amigos que surgiram através das amizades dos meus pais. São aqueles que conhecem a gente desde a barriga, que fizeram todas as viagens, os churrascos, os programas que a turma de amigos deles faziam e nos carregavam junto. Esses amigos são especiais, Dependendo da proximidade dos pais, nós, as crianças, ficávamos ainda mais próximos, quase irmãos. Alguns acabam se afastando, é inevitável, mas o carinho e a bagagem de tantas aventuras está lá. Os banhos na chácara, os quartos divididos, as guerras de travesseiros, está tudo lá na memória.
Quando minha mãe faleceu, herdei ainda algumas amigas dela, que continuam expressando sua enorme amizade em mim. É como se fosse um upgrade. Por mais que eu convivesse muito com elas antes, estava ali na posição de outra geração, quase de penetra nas conversas e nas risadas. Hoje,  herdei o carinho.
Mas o mais legal é que agora vejo tudo isso por outro angulo, são os meus filhos que estão herdando uma quantidade enorme de amigos, filhos dos meus amigos. As crianças da turma já são um bando de irmãos que se adoram, brincam e tem o maior carinho um pelo outro, independente da idade. Eles já criaram o vínculo, já são uma turma independente de nós, adultos. Já tem suas aventuras, viagens, seus quartos divididos, está tudo lá na memória deles também.
E fico particularmente feliz de ver isso acontecer com outras turmas, amigos queridos que nem moram aqui. Como é bom esse encontro. Como é bom dar aquele abraço de saudade na sua amiga e ouvir ao fundo as risadas das nossas crianças totalmente á vontade umas com as outras, tramando os encontros, exigindo um maior contato, programando uma viagem pra poder descontar as saudades delas. São encontros mágicos. Não importa quantas vezes se vejam num ano, eles tem cumplicidade, tem papo, tem intimidade. 
Acho que não poderia ser diferente quando as amizades são verdadeiras. O carinho é enorme e contagia todo mundo. Nessas relações, fica todo mundo muito próximo, gostamos dos filhos dos amigos como filhos nossos, gostamos dos amigos dos nossos pais como tios verdadeiros, criamos esses novos laços, criamos essa nova família. Família escolhida, herança boa. Criançada reunida. Coisa melhor não tem!

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Sonho meu

Os sonhos são a base da realidade. Essa frase ouvi de gente que leva esse negócio de sonho à sério. Gosto de gente que investe no sonho, se dedica, faz acontecer. Não é sempre fácil, não é sempre que você vê gente disposta a acreditar na possibilidade de realizar os seus sonhos mais incríveis.
Estou falando aqui de sonhos no mais verdadeiro sentido da palavra. Aquelas vontades absurdas que você se deseja, coisas que te impulsionam e que geralmente são desacreditadas por todo mundo que te cerca.
Imagina se ele vai gravar um disco em Abbey Road, nem músico profissional é! Imagina se ele vai conhecer o Sean Penn, nunca! Imagina se ele vai viajar de bicicleta pelo mundo por dois anos, vai viver de que? Pintar, maratonas, escaladas, seguir bandas, mosteiros na Índia, o céu é o infinito! 
Sonhos são poderosos, são propulsores das maiores transformações nas nossas vidas.
E não falo aqui dos sonhos "concretos", aqueles que a gente sabe que vai realizar como as carreiras que escolhemos e o sucesso que queremos com essas escolhas. 
Falo dos sonhos incríveis, que te tiram da zono de conforto, que te fazem mover mundos, sair da sua realidade, entrar no mundo da alegria pura. 
Aprender a sonhar e perseguir esse sonho deveria ser matéria de escola. Quem sabe assim teríamos pessoas mais felizes e realizadas, mais competentes e persistentes, mais focadas e criativas.A gente vice hoje num mundo onde todo mundo corre e não tem tempo pra nada, muito menos pra ir atrás daquela viagem impossível, daquele show do outro lado do mundo, daquele hobby que emociona.
E também não faço a apologia do "vou largar tudo e vou me jogar". Ao contrario, faço a apologia do levar seu plano muito à sério, planejar, criar, viabilizar o que te faz feliz sem precisar deixar de ser o que você escolheu ser e te trouxe até aqui. A gente pode ter os dois. A gente deve!
O meu sonho infelizmente nunca poderei realizar, Fred Astaire e Gene Kelly não terão nunca o prazer da minha contradança. Mas o Barishnikov ainda está ai, e quem sabe com muito esforço da minha parte, eu possa tentar. Vou começar os ensaios hoje!


quarta-feira, 7 de maio de 2014

Minha pequena Curitiba

Minha cidade encolheu. Sim senhor! Não importa o quanto digam que ela está cada vez maior, com mais gente, mais carros, fisicamente maior. Pra mim, Curitiba está cada vez menor. E aposto que para você também.
E é justamente o crescimento das grandes cidades que está deixando Curitiba cada vez mais pequetitica. Como? Eu explico:
Antigamente, quando Curitiba era uma jovem cidade de menos de dois milhões de habitantes, a cidade toda era integrada. Vivíamos todos numa agradável pequena cidade onde você circulava tranquilamente, conhecia tudo, trombava com os amigos em todo lugar. Não tinha um restaurante novo que abria que a gente não soubesse imediatamente. Não tinha peça no Guaíra que não virasse uma festa de amigos conversando animadamente no intervalo. Não tinha loja, mercado, que você não soubesse onde era e o nome do dono. Não tinha problema em sair de casa para cruzar a cidade, o que levava no máximo enormes 15 minutos. Nessa Curitiba, tudo era comum, tudo era dos Curitibanos. 
Hoje as coisas estão bem diferentes. O crescimento desordenado dessa nossa querida Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais de Curitiba trouxe o que pra mim é a pior coisa que poderia nos acontecer. Fomos divididos em micro cosmos, micro cidades, micro guetos.
Minha Curitiba hoje não tem mais de 5 km de raio. Tenho que viver confinada nesse espaço porque não quero ficar confinada no meu carro. Não quero ficar confinada no trânsito. Tudo o que faço tem que estar nessa minha nova micro vila: a escola das crianças, o meu escritório, a casa dos parentes, a loja preferida, os restaurantes e eventos culturais. Tudo socado entre Cabral, Juvevê, Centro Cívico e adjacências. Poucas adjacências. 
E isso está acontecendo com todo mundo. Não dá mais pra visitar fulano por que ele mora muito longe, não conheço o restaurante por que é do outro lado da cidade, não escolho essa escola por que é fora do meu caminho. 
Que coisa triste! A cidade toda recortada. Famílias separadas como em zonas de guerra, amiguinhos que não brincam, vizinhos que não se conhecem nessa mesma cidade que um dia foi tão próxima. 
Não somos mais uma cidade, somos pequenos micro bairros, cada um com suas particularidades, segregados, quase fechados. A turma do Batel não conhece os restaurantes do Cabral, a turma da Água Verde não compra no Ahu. Quem mora no Bigorrilho não frequenta o Cristo Rei, quem corre no São Lourenço não passeia no Barigui. Isso sem entrar no mérito das distancias sociais que são outro complicador que só intensifica essa nossa separação.
Quero voltar a viver numa cidade plena. Quero meu direito de ir e vir restaurado com dignidade. Quero que parem de dar nomes esquisitos aos bairros só pra criar ainda mais demarcações. Não existe Jardins em Curitiba, nós sempre tivemos o Alto da Quinze, no máximo a Itupava. Não conheço o Arte Cívico, nada disso é importante.

Perdemos a intimidade enquanto cidadãos. O que essa cidade precisa é voltar a se gostar, voltar a se valorizar, e isso passa pelas pessoas. Precisamos integrar mais, separar menos. Precisamos voltar a conhecer a cidade, voltar a passear, transgredir as fronteiras. Voltar a Curitiba, a cidade de todos nós.

Verdes anos

Sou uma eterna saudosista, dessas de carteirinha! Acho que é por que eu tive muita sorte nessa vida. Tenho memórias pra lá de especiais dos meus verdes anos. Tudo incrível!
Minha memória aliás, (com o desgaste natural de quem já deixou pra trás quatro números trágicos que indicam nossas décadas) está cada vez mais seletiva. Cada vez gosto mais do meu passado, cada dia que passa ele fica mais bonito pra mim.
Acho que é porque estou revivendo a adolescência através dos meus filhos. Eles estão naquele tempo mágico, descobrindo a vida e eu me pego repensando as minhas próprias descobertas. Eles vivendo e eu sonhando. Eles querem sair sozinhos, estar sempre com os amigos, viver só o prazer. 
Eu vivi isso na plenitude que a segurança do século passado permitia. Minha juventude foi como as músicas do Belchior, do Sá, Rodrix e Guarabyra. De um tempo que jovem ouvia MPB. Andar na rua, cabelo ao vento, gente jovem reunida. 
Eu tinha muita liberdade, mas tinha muita responsabilidade. Pelas minhas contas poderia ter ido à Lua somando meus quilômetros da Itapemirim. Era tudo muito simples e a gente precisava de muito pouco para ser feliz. Uns trocados, uma passagem, uma praia, um ingresso pro cinema, um livro, e principalmente amigos e mais amigos, de preferência pelo menos um que soubesse tocar violão. Um Bariloche (sobremesa que existia na extinta confeitaria Petit Café, ao lado do cine Condor) também ajudava. 
Meus filhos precisam de muito mais coisas, e isso me aperta o peito. O mundo deles é cheio de gadgets, marcas, bolsas, tênis e exigências mercadológicas que eu jamais sonhei ter com 15 anos. É coisa demais pra se lidar com essa idade, difícil demais. Eles ainda não conseguiram ver que a simplicidade das coisas que é o grande barato. A risada coletiva, amigos dormindo em casa, aquele nascer do sol incrível depois da balada, a aventura de descobrir uma praia secreta, os segredos sussurrados, a apresentação de ballet, o primeiro beijo... são essas as coisas que eles vão lembrar quando chegarem na minha idade. São coisas imateriais, coisas etéreas, coisas que nem são coisas.

Então só me resta cuidar muito bem do meu presente.  Tenho obrigação de ser tão ou mais feliz que sempre fui. Preciso que o meu presente seja especial. Só assim as memórias dos meus filhos também serão incríveis.  

Os encantos da Divina.

Estou em Caiobá, praia onde passei quase todos os verões da minha vida. Mas nem de longe essa é a mesma praia da minha infância. Assim como as cidades crescem e mudam, até mesmo esse minúsculo balneário no minúsculo litoral do Paraná também sofreu suas mudanças.
Caiobá começava no Ed. Itamar e, na minha memória, era quase que um prolongamento de Curitiba, e por isso apesar de ser uma cidade de praia, tinha uma dinâmica bem engraçada, enraizada nos costumes dos curitibanos, povo de invernos rígidos, sério e um tanto pudico.  Todo mundo acordava cedo, todo mundo ia a praia lá pelas 9 horas. A gente levava sapato na mala.  Não se passava protetor e sim Noskote no nariz e nas bochechas, só. A gente tinha muito medo dos salva-vidas que viviam gritando pra gente sair de onde a gente sempre queria estar, no fundo!  A gente comia ovo duro, sanduíches embalados em papel alumínio e laranja numa praia sem ambulantes. Aliás, a gente fazia três refeições, nos horários normais, meio dia era hora de ir pra casa, tomar banho e almoçar. Depois, depois era o paraíso.
A praia, mais que a areia e a água, era um espaço de experiências e descobertas. Como Caiobá era uma vila, era lá que nós, crianças, começávamos a descobrir a liberdade de sair sozinhos, brincar na rua com os amigos até tarde, andar de bicicleta, pescar siri, se aventurar. Tudo sem um adulto por perto. Aliás Caiobá parecia povoada só por crianças. A gente tentava entrar na única piscina da cidade, a da Mapi (Ed. Caiobá), que era fechada só para os moradores. A gente vendia esteirinhas feitas de palito de picolé, a gente aprontava pra valer. 
A gente no caso era a turma da minha escola que ia toda pra lá. Toda a comunidade Judaica de Curitiba "descia"e cabia em cinco prédios, o Itamar, a Mapi, o De Morais, a Chameckilandia (Ed. Dona Raquel) e o Apolo. Juntava umas 40 crianças, a gente fazia gincana, esconde-esconde, teatro, era realmente muito divertido. Culminando a brincadeira, tinha a esperada ida até a Ilha do Mel, aventura das aventuras, que fechava a temporada de três meses nesse idílio. 
A Caiobá de hoje é outra. Pra começar,  ela começa em Matinhos. Os três quilômetros da Praia Braba estão tomados de casas e prédinhos. O Itamar é hoje quase o último prédio da praia. Incrível! As simpáticas vilas, casinhas germinadas que eram o charme dessa praia, foram substituídas por edifícios de arquitetura caprichada, mas que acabaram com as cantorias na varanda comum de antes.
Quase um milhão de pessoas vem a Caiobá, principalmente entre o Natal e o Ano Novo, a maioria delas do interior do estado. Essa multidão forma um formigueiro humano inacreditável pra quem cresceu nessas bandas.  Dá pra ver de longe quem são os antigos e os novos habitantes dessa mistura. Quem come em casa e quem enche os restaurantes de fast food. Quem tem casa e quem tem apartamento. Você faz a caminhada de 6 quilômetros (ida e volta pra Matinhos) sem ver um rosto conhecido.
A praia hoje "abre" cedo para crianças, mas é bem mais tarde que tudo acontece. As pessoas vão chegando mesmo lá pelas onze da manhã, muitas delas  só saem lá pelas oito da noite. Da pra almoçar na própria praia, tem sanduíche natural, esfirras, quibe, cozinha, pastel, milho, espetinhos, queijinho, salada de frutas, sorvete, tapioca, o que for!
Mas o que mais mudou pra mim é a vida das crianças. Como quase todo prédio agora tem piscina, a criançada trocou as aventuras pelas tardes em casa. Com medo da violência que essa cidade quase grande e cheia de perigos pode ter, os pais supervisionam, acompanham, participam das brincadeiras que antes eram só delas. Agora são os adolescentes que vivem toda essa experiência que antes vivíamos ainda crianças. Começa aos quatorze, a liberdade que tínhamos com oito, nove anos.

Mas muita coisa ainda está igual. Você chega e sempre tem que arrumar um monte de coisas na sua casa. A ponte entre Caiobá e Guaratuba continua um sonho distante. A gente ainda tem que cruzar o canal nojento que invade e divide a praia Braba. A distância social entre a Mansa e a Braba é infinitamente superior aos poucos metros que as separam. A pracinha de Caiobá  continua o lugar perfeito pra se abandonar as rodinhas das bicicletas. Os maridos ainda vão pra trabalhar em Curitiba só voltando no fim de semana. O sorvete de abacate da Bom Sucesso ainda é o melhor motivo pra se pegar o Ferry Boat. Um livro é o melhor complemento da cadeira e do guarda-sol. A praia ainda é aquele lugar pra se encontrar os amigos, sem cerimônia, sem relógio e conversar, conversar até que alguém tenha fome, o sol se ponha ou acabe a bebida. A praia ainda é o melhor das férias.

Uma casa muito engraçada

     Minha casa, isto é, a casa dos meus pais, onde morei desde que nasci e de onde sai só quando casei, saiu numa das publicações mais importantes sobre arquitetura, a Archdaily. A casa foi desenhada pelo meu pai no comecinho da década de 60 e era muito moderna para a época. Ainda é.
     Sempre brinquei que morei numa casa conceito é que isso valeria uma história. Aqui está.
     A casa era, ainda é, muito diferente de todas as casas que eu conheci na vida. Por anos achei que a primeira estrofe da música A casa, do Vinícius de Moraes, tinha sido feita pra ela afinal, o Vinícius em pessoa esteve lá algumas vezes, o que me rendeu um lindo exemplar da Arca de Noé, autografado com um versinho!
     Era certamente a casa mais bacana da turma, era a mais bacana da escola inteira. A minha casa tinha grama no telhado!!!  Pronto, não tinha como ganhar disso. Isso por si só, em 1965, era algo extraordinário. Onde mais a gente tinha permissão pra subir o muro, escalar uma paredinha pra ir ao telhado? Lá em casa tinha. A gente podia brincar, correr, tomar sol, fazer piquenique no telhado. Só não dava pra jogar bola porque ele era inclinado. Todo mundo adorava vir brincar na minha casa. 
     A casa é toda de concreto e vidro. Tem três níveis. É tão diferente que a gente já entrava no nível do meio, onde ficava a sala e a cozinha. Descendo uma escada, os dois quartos e o banheiro. Pois é, casa compartilhada, irmãs dormindo juntas e um banheiro para toda a família. Subindo outra escada, o escritório do meu pai. Só depois de muitos anos, meu pai trocou um projeto por um pedaço do terreno do vizinho, ganhamos mais uma sala e meus pais uma suíte. Apesar de ganhar um quarto só pra mim, perdemos a ameixeira do vizinho nessa obra, perda irreparável!!
    Se por fora a casa era arrojada, dentro tinham coisas incríveis também. Nossa lareira era de concreto, em forma de gota, suspensa do chão e roxa! Já viu isso antes? A estrutura do concreto que ficava aparente em alguns lugares, criava esconderijos fantásticos pra brincar de esconde-esconde. Tinha uma adega muito escura, pelo menos aos meus olhos de criança, que eu não tinha coragem de entrar não importando o valor da aposta. No lavabo, a coisa mais divertida da casa, o famoso pôster do Frank Zappa no banheiro, alaranjado!
    Uma das coisas que mais gostava na casa era a cozinha, toda azulejada, do piso ao teto com azulejos do Poty Lazarotto. São quatro modelos que se intercalam, numa linha tem um com o pescador e outro com os peixes, na outra linha têm um de passarinhos e outro com o caçador. Lindo! 
     Hoje a casa é o escritório do meu pai. Eu trabalho lá, no meu antigo quarto. Sou o exemplo literal do bom filho que a casa torna. A casa mudou muito para acomodar a nova função, mas a gente tenta preservar o máximo possível as suas características arquitetônicas. Não se mexe numa lâmpada, não se coloca um prego sem aprovação do meu pai. A lareira ainda está lá, roxinha da Silva. O Frank Zappa, infelizmente, se perdeu num arroubo da minha mãe que quis marmorificar o lavabo todo (mais chique!). 
    Ganhamos um gazebo, ganhamos uma biblioteca e dois novos volumes onde as salas de trabalho estão. As árvores plantadas pela minha irmã são hoje enormes e frondosas, Mas a casa ainda tem a sua alma, chora nas velhas goteiras, estala suas velhas madeiras. Para nós crianças, era a casa muito engraçada, agora adulta, consigo ver o quão especial ela foi e ainda é. Ao contrario da música, nossa casa sempre teve tudo!


Batizada no Belém

Costumo dizer que não tem ninguém mais curitibana do que eu. E é sério!
Tive uma infância e adolescência tipicamente curitibana. Ia desenhar no calçadão da XV, fiz cursos de artes no Centro de Criatividade, comi muito mini pastel no Pasquale. Era formada em Pedalinho, assídua no teatro do Piá, tinha passe livre no Parque Alvorada. Comi pinhão no corpinho de jornal enrolado nas cadeiras do Couto Pereira. Fiz muito churrasco nos quiosques de todos os parques (você fez no Barreirinha?), batia ponto na Feirinha, conhecia pelo nome os motoristas da linha norte e Sul do expresso. Dancei no Guaíra (grande auditório). Sei as primeiras estrofes da música do Paulo Vítola sobre a cidade (do disco Curitiba Cidade da Gente, o do Bebedouro). Saí no Dino. Até aí tudo bem, você deve estar pensando. Porém brinco que tenho três estrelas no meu currículo curitibocas que são difíceis de igualar: primeira, fui maquiada por um irmão Queirolo para ser a Boneca de Piche na gincana de escolas do Programa Mario Vendramel e tenho isso em vídeo. Complicou a competição, não é? Segunda: escrevi um dicionário de 300 verbetes em curitibanês no aniversário de 300 anos da cidade que saiu na extinta Vejinha. E agora, pra tirar a chance de qualquer um nessa disputa, minha cartada final. Sou tão curitibana que até já tomei banho no Rio Belém, isso na década de 70, antes da despoluição do mesmo. Fui ungida em curitibananice nas águas turvas do nosso rio maior. Pronto ganhei!
Mas o que me torna a curitibana das curitibanas é que tive, e tenho, Curitiba como minha irmã, a caçula, a quem jurei fidelidade.
Cresci com a cidade no meio da mesa do almoço e do jantar. Cresci escutando em primeira mão as mudanças que iriam transformar a vida e a cara dessa cidade pacata, onde eu brincava na rua. Cresci discutindo (sim, discutindo, porque mesmo pequena, tinha voz ativa na conversa) os projetos às vezes mirabolantes que estavam por vir. 
Vi meu pai e minha mãe cuidarem dessa cidade como se fosse uma filha. Meu pai pensando em seu futuro, minha mãe no seu bem estar. Como uma família. Assumi o meu papel.
Por isso sinto um ciúme descomunal de cada rua e casa dessa cidade. Por isso, cada vez que falam que o Curitibano é isso ou aquilo, acho que é ofensa pessoal. Por isso sofro quando as casas da minha memória são levadas pela especulação imobiliária. Por isso me irrito ao máximo com o padrão dos novos postes de luz que parecem pinicos ao contrário invadindo nossas ruas. Por isso choro com cada arvore que cai. Por isso ligo pro 156 pra contar as pequenas feridas que vou vendo aparecer na minha cidade.  Por isso me destempero quando mudam ruas sem um estudo mais aprofundado. Por isso tenho vontade de montar acampamento em frente ao Ippuc pra pegar todo mundo na entrada e dizer: cuidem, prestem atenção no que vocês estão fazendo! Por isso me angustio com essa saopaulização de costumes. Por isso procuro ir sempre mais longe nos meus caminhos para não perder o contato com as tantas outras Curitiba que distantes, parecem outras cidades. Me sinto a ombudsman de Curitiba. 
Mas por isso também curto as coisas da cidade com mais intensidade. Vibro com cada festa popular, cada iniciativa bacana. Curto os night bickers que há uma década iluminaram as nossas noites e abriram caminho pra que as magrelas voltassem a ser consideradas um meio viável de transporte. Como em todas as feiras gastronômicas que abusam da nossa sorte climática e apostam nesse lado gregário dos curitibanos. Ando e ando e ando pela cidade, vendo cada gato na janela. Vou passear na XV só pra matar a saudade. Vou ao MON religiosamente. Vibro com todo artista que consegue sobreviver a nossa antropofagia e brilhar em outras bandas. Uso os parques, vários deles. Provo os restaurantes que abrem mas não esqueço dos clássicos. Vou à feira. Fico nos feriados. Crio raízes.

Por isso, não me perco nunca em Curitiba, afinal, onde estiver, estou em casa!