terça-feira, 19 de novembro de 2013

Picasso

A década era a de 70 e a Feira de Artesanato de Curitiba, a feirinha, não passava de uma centena de barraquinha que enchiam uma quadra do Largo da Ordem, bem do ladinho da então maior atração turística da cidade, o Relógio das Flores. Sim meus caros, o Relógio das Flores era a parada obrigatória de todo mundo que visitava nossa comarca naqueles mágicos anos. Uma foto ali era a prova derradeira que a pessoa esteve mesmo em Curitiba.
A feirinha era também o grande programa de domingo de sol ou melhor, de não chuva. A gente ia sempre lá até os meus 10 anos. Sagrado. Ouvir o chorinho, comprar aqueles anéis e colares de florzinhas de miçangas coloridas, dar uma olhada na última moda em carteiras, cintos e sandálias de couro, ver os maravilhosos moveis de madeira laqueados e pintados com flores rosa pra por na casinha de bonecas, ver as esculturas de arame retorcido, pedir uma caricatura, namorar uma bonecas de pano, ouvir o sino de vento de pedras brasileiras da primeira barraca, ir no teatro de bonecos...coisas tão enraizadas na minha memória.
A Galeria Acaiaca, ali localizada, era um oásis de sombra, cadeiras e refrigerante para mim em minhas andanças pela freirinha na minha infância. E um dos principais motivos pra gente ir na feirinha pois o Sade, dono da galeria, espertamente marcava todas as vernissages importantes pros domingos de manhã. E todo mundo ia lá. Foi na Acaiaca que tive o meu primeiro encontro com as artes e com a fanta laranja, servida por garçons de terno branco (um must na época) em copos baixos de whisky. Como a nossa família ia muito lá, eu me sentia em casa e o Sade nunca me chamou a atenção, nem mesmo quando a gente brincava de se esconder, corria pelos salões, entrava na reserva técnica enquanto meus pais conversavam horas com os amigos. Eu me sentia meio dona do lugar. E nessa brincadeira toda, conheci o Poty, o Calderari, o Fernando Velloso,o De Bona, o Erico da Silva e todo mundo que era alguém no mundo das artes paranaense. Me lembro muito desse espaço, de brincar que eram meus os quadros ali pendurados, ajudar meus pais na escolha de alguns deles, ficar olhando as pessoas na feirinha pelos imensos (pra mim) janelões de vidro, ficar tentando descobrir o que eram aquelas bolinhas coloridas do lado dos quadros, das risadas, do cheiro de cigarro e whisky, do colorido, da estranheza de algumas peças, de sentar em esculturas. Não poderia ter uma iniciação artística mais divertida.
Também foi na Acaiaca que ganhei o meu primeiro quadro que está orgulhosamente pendurado na parede da minha casa, isso com 6 anos. Contava assim a lenda a minha mãe. Na saída da galeria, meus pais me pegaram com o tal  quadrinho na mão e foram devolver pro Sade achando que eu tinha pego o dito cujo. Ai o Sade explicou: " É dela, ela ganhou daquela senhora que ficou encantada com a pequena parada na frente do quadro dizendo, não é um Picasso!"

Nenhum comentário:

Postar um comentário